Fracasso- Renê Paulauskas

O fracasso me alcançou. Entrou como um grude na sola do sapato. Foi difícil de perceber no início. Era uma coisa aqui, outra ali, mas nada me abatia por esse lado. Fui andando pleno, confiante. Até sentir o grude prendendo meu passo. Continuei, mancando, mas ativo. Até começar a sentir o cansaço. Os caminhos iam se fechando, as ruas se estreitando. Os corredores derrepente se viam vazios. Com o tempo fui ficando sem ar. Meu otimismo, quase imbatível, deu lugar ao deus dará. Toda força que parecia inata deu lugar a um ser que mal consegue caminhar. Estou cansado. Cansado de lutar. Quero descansar num canto. Estou cansado de tanta coisa. O escuro me acalma. Talvez precisasse desse dia. Desse morrer. Sentir esse dia como um um pouco morrer, mas ainda estar vivo. Ainda respirar. Mesmo que em silêncio. Ouvindo as gotas da pia. Que a vida não depende de mim. Que posso fracassar. Que o mundo não é perfeito. Que as pessoas morrem. Que existe fome no planeta. Que utopias são sempre utópicas. Que existem coisas piores. Mas isso não tira a beleza no planeta. E que se eu não for tão egoísta, capaz de nem ficar tão triste com meu fracasso. Que fracassei, mas não no essencial. No olhar me tive pleno. No riso também. No apoio aos amigos. No cuidado com a filhota. Na parceria com minha mãe. No final, o fracasso ficou pequeno. Tão pequeno que deu vontade de voltar a andar.

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