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Mostrando postagens de março, 2019

Tanto- Renê Paulauskas

Tanto que o homem fez, pra gente fazer tão pouco. Tantos homens, mulheres, gênios. Que deram tudo de si a algo. Quantos desses vingaram, floresceram? E tantos outros, gênios, ignorados. Por não serem compreendidos, mas também porque os donos do poder tinham outros interesses, interesses escusos. Quanto vale a obra de um homem? Pra que? A quem pode servir? Seria a pergunta correta. Enquanto gênios pensam a vida melhorar, usam seus cálculos para uma nova guerra.

Pesadelo- Renê Paulauskas

Sonhei que vivia a era Bolsonaro. Não era sonho, era um pesadelo em que não conseguia acordar. Milicias, polícias, baixas patentes do exercícito se achavam no direito de censurar, agredir, e até matar as pessoas. Defendiam a volta da ditadura. Nos quarteis comemoravam o início do golpe de 1964. Garrafas, gritos, tortura. Pessoas desaparecidas. Mães de luto. Gritos, carnaval. A cada instante chegamos mais perto do impossível. A cada instante nos afundamos mais e mais. Como acordar agora onde nos tiram pouco a pouco o sonho e a liberdade? Como acordar se ainda estamos no início do pesadelo?

Menino e defunto- Renê Paulauskas

Entre o menino e o defunto, gosto mais do menino. É mais bonito, viçoso. Mesmo tímido como uma pedra. Ainda dança, sorri. Entre o menino e o defunto, gosto mais do menino, mas me acomodo melhor ao defunto. Que senta pra descansar a perder a hora, o dia. Que é sereno por mais nada esperar da vida, por já ter morrido. Que tem por vida somente esperar. Esperar o menino chegar.

Miragem- Renê Paulauskas

Hoje ele estava rindo. As miragens o divertiam. Poucas preocupações. A vida voltava a ter eixo. Não era como antes. O sacrifício o deixara mais astuto. Mas voltara a viver. As ilusões se desfazendo, mas sempre deixando uma núvem no final, pra se brincar, soltar a imaginação, desejar enfim.

Amigos- Renê Paulauskas

Hoje falei com um amigo que estava brigado. Parece que fizemos as pazes, ou restauramos o respeito e afeto um pelo outro depois de um mês de nossas agressões físicas e morais. Me faz ver como ultrapassamos o limite de qualquer relacionamento. Como somos perigosos um pro outro. E mesmo assim, como ainda existe afeto, apezar das contradições. Decidi seguir sozinho, sabendo que nossa amizade vinha correndo risco, já há varios meses. Mas senti uma inclinação a chama-lo para tocar. Fazermos música mais uma vez. E nos sentirmos vivos.

Toque- Renê Paulauskas

Não toque naquela pessoa, não toque não! Que carrega maltratos na pele, que se a tocar, pode se assustar. Ou mesmo reagir agressivamente para se defender. Aprenda, que essa pessoa você perdeu o direito de tocá-la. Por ínumeros motivos. Seja o de não ter tocado antes, quando tinha permissão. Seja por motivos dela, de se fechar a você. Que você não teve culpa, mas não toque nela! E não tenha ódio, se for possível. Melhor é não pensar nisso. E tocar em outra pessoa.

A casa- Renê Paulauskas

A casa da minha mãe também é minha assim como é de minha avó. Tem um jardim com uma Primavera gigantesca que dá para ver da rua. Meu quarto fica logo após a casa da minha avó. Minha mãe mora na casa do fundo onde fico com ela. Na cozinha papeamos enquanto ela cozinha. A comida mais gostosa do mundo e um dos maiores prazeres do dia, comer. A casa toda é antiga e muito simples. Poucos cômodos com pé direito alto. Na cozinha tem móveis de madeira com história. Uma mesa e uma estante de um grande amigo do meu pai. A sala tem um quadro singelo feito por minha mãe do lado de um móvel fazendo papel de oratório a um santo indiano. No quarto da minha mãe tem duas camas. Numa delas passei parte da infância me curando de gripes e outras enfermidades. Descendo, depois do jardim e a lavanderia, está o meu quarto. Tem uma escrivaninha, onde passava horas desenhando quando era mais novo. Encima dela hoje tem um teclado. Mas fico mesmo tentando tocar o violão, presente de um grande amigo, sentado e

O jardim- Renê Paulauskas

Hoje quando passei pelo lado externo da casa reparei no jardim. Árvores novas crescendo, mesmo sob a gigantesca Primavera que é vista até da rua. O canteiro profundo e cheio de vida após a chuva. E só no final, lembrei de olhar pra rua. Algo está mudando no meu olhar.

Origens do fim- Renê Paulauskas

Quando era jovem vivia a vida, roubava beijos das mulheres mais bonitas, dançava com todas sem me preocupar com nada. Despreocupado, tudo era permitido. Por terminar um relacionamento com uma mulher casada, me culpei, como se fosse o responsável pelo fim de seu casamento. Ledo engano. O fato dela se apaixonar por mim já demonstrava que não sentia mais nada pelo marido a não ser uma forte amizade. Depois disso passei a evitar quaisquer relacionamentos com mulheres comprometidas, e deixei de viver. Mulheres interessantes em fins de relacionamentos acendiam o sinal verde e eu não fazia nada, ou melhor, me esquivava. Tudo resultado desse grande trauma do passado. Hoje vejo meu erro, e espero não errar mais, voltando a viver, sendo que ainda não sou tão velho. Tudo vale a pena se a alma não é pequena.

Escritos da ilha- Renê Paulauskas

Tenho medo de ir pra rua e me perder sem um objetivo, um foco. Como me perdi outras vezes, mesmo conseguindo voltar, com ajuda dos orixás. Adoro caminhar com pessoas que gosto. O foco passa a ser a pessoa, e isso é obvio. Para caminhar sozinho é preciso um motivo, um porquê. Nenhuma pessoa é uma ilha. Tenho excluido o máximo de contatos indesejados para deixar terreno aberto para novos contatos interessantes. O problema é que essa técnica não tem dado muito certo. Volto sempre aos velhos contatos, carcomidos, empoeirados. E o novo sempre demora a aparecer. Ou vem com cara de já velho, ultrapassado. Me podando, ou podando os envolta de mim vou ficando cada vez mais sozinho, isso é fato. Meu problema é a falta de paciência. Ela que rejeita o mesquinho, o desarmônico, o enfadonho, o trivial, o desprazer, enfim, tudo que me desagrada. Então caio solitário nesse mundo imperfeito, cheio de tantos diabos. E me pergunto se tenho coragem de ir pra rua denovo. Depois de tantos tombos. Machuca

Fim- Renê Paulauskas

Sempre que acontecia alguma merda na vida dele ele pensava “e agora?”. Podia ser o fim de um emprego, um relacionamento, uma amizade. Era sempre o fim de algo que lhe dava sustento em algum sentido. E a pergunta “O que por no lugar?”. Acontece que as coisas não funcionavam dessa maneira, antes fossem assim! Pra coisas novas dependia tempo, entrosamento, história. E ficar esperando é o que menos queria nessas horas. Era como uma prisão, uma punição. Normalmente suas rupturas eram agressivas, ou continham agressões. Mais de uma vez terminou machucado, alguma parte do corpo quebrada. Isso na melhor das hipóteses, quando não tinha remorsos de ter machucado alguém que já fora querido em sua vida. Na maioria das vezes apanhava mesmo. Nos últimos tempos estava cada vez mais tolerante e equilibrado. Mesmo assim não tinha sangue de barata. Foi encarar um capoeirista dez anos mais jovem. Errou o primeiro soco e levou cinco golpes na cabeça. Resultado: fim de uma amizade de sete anos. Qua