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Mostrando postagens de 2022

celular novo- Renê Paulauskas

Minha mãe comprou pra mim um celular novo, o velho não funcionava mais. Ele é tão pequeno que é impossível escrever nele, por isso hoje, escrevo aqui no computador. Acho que vai ser bom começar a escrever aqui, mais profissional. E o celular, esquenta e descarrega em poucos minutos de uso, só vou usar em extrema necessidade.  

Homo Óculos - Renê Paulauskas

Nossa espécie, depois do advento do smartphone, deveria passar de homosapiens sapiens para homo óculos, do tanto tempo que passamos vendo coisas no celular. Distrações, coisas inúteis, e todo um mercado estratégico para essa demanda.

Desgovernado- Renê Paulauskas

Os mesmos trilhos, a mesma estrutura, trem desgovernado. Corpos sãos, mente não. Se exprime a visão realidade. Anjos, Deuses, coabitam a materialidade da carne. Tem que fingir que só vê o chão.

capitalista- Renê Paulauskas

Para ser um capitalista comece não dividindo o que é seu com ninguém. Segundo, transforme tudo a sua volta em dinheiro. Terceiro, gasta o mínimo e acumule o máximo. Certamente terá uma vida infeliz. Talvez no último suspiro pense em fazer tudo diferente. Mas será o que essa burrice te levou.

Portas- Renê Paulauskas

Só fecho portas quando não há mais o que se fazer. Quando cortaram o diálogo, quando, em outras palavras, já fecharam a porta. Então fico sozinho, lambendo minhas feridas, até sair de novo. O mundo é essa constante renovação. Dolorosa, mas essencial.

Pessoa errada- Renê Paulauskas

Era a pessoa, a pessoa errada. Cobria um vazio no aspecto social, mas era torta, desprezível, não condizia com seu lugar do lado dos outros. Não tinha empatia, era incapaz de reconhecer seus erros, mais ainda de pedir desculpas. Era um erro. Melhor um espaço vazio que algo que a gente se arrependa.

Compulsão - Renê Paulauskas

Fico aqui escrevendo há dez anos só nesse blogue, esperando que a arte se concretize, que tenha um sentido. Mas me deparo com o risco de ter tudo apagado ou nem ser lido. Como uma compulsão que morre com seu doente. É preciso correr atrás, é preciso mais.

Tempo livre- Renê Paulauskas

O que fazer com o tempo livre, é fácil quando se está bem acompanhado, seja um amigo ou uma paquera, mas o que fazer quando se está sozinho. Vejo muita TV, como, caminho, às vezes leio, escrevo e até faço umas musiquinhas... Ainda assim sobra tempo livre. Acho que eu estou precisando trabalhar.

Família - Renê Paulauskas

Matei meu pai, fui morar com a minha mãe, virei mãe da minha filha e amigo da minha irmã.

Ratoeira- Renê Paulauskas

 Ratoeira, modo horrível de matar um ser vivo. O induzindo pela fome a pegar um pedado de queijo é pego e esmagado sem dó. Gatos são mais eficientes, também levados pela fome, matam dentro de sua cadeia alimentar, não como nós, que matamos tudo a volta só para nos sentirmos limpos.

Riso- Renê Paulauskas

 A flor do seu abraço. Ar fresco. Distração, tempo voa. Frutas, novidade. Riso, coração. Renovado.

Ventilador - Renê Paulauskas

 Um ventilador, o tempo Uma formiga atravessa A lua cheia, preguiça  O rio negro desaparece

Churrascaria-Renê Paulauskas

 Depois de estar há quase dez anos trabalhando como caricaturista fui contratado por uma empresa de telefonia para fazer eventos em congressos e hotéis por quase todo o país por seis meses. Estava eu com vinte e nove anos. Ficava nos melhores hotéis, comia a comida mais cara, cheguei a ficar até com problemas dentais de tanto frequentar as churrascarias de cada cidade onde ficava hospedado.  Quando terminou o trabalho quis levar minha família também numa churrascaria. Pegamos o carro, minha mãe, minha avó, minha irmã e eu e começamos a rodar pelos arredores aqui da Lapa em São Paulo. Entramos em uma, sentamos. Mas fiquei meio descontente por não ser uma churrascaria do padrão das que havia comido Brasil a fora. Foi então que minha avó olhou pra mim e disse: ''O Renê tem uma cara de pobre''. E todos rimos, não só da pérola dita por minha vó, como da situação. 

Paredes descascadas- Renê Paulauskas

 Canos de vassoura, baldes velhos com coisas pra jogar fora, rachaduras no chão. Essas coisas acho que aparecem na maioria das casas pobres, sempre que as encontro percebo que estou numa. Nós pobres não perdemos tempo olhando essas coisas. Tem coisas que até arrumamos, como jogar o balde de coisas velhas no lixo ou até comprar vassouras novas, mas algo como a rachadura do chão é mais difícil de tapar.  A primeira vez que tentei impedir alguém de ver a situação da minha casa, era criança. O chão da cozinha estava caindo, as paredes criavam desenhos através de várias camadas de tinta descascadas.  A segunda foi com uma colega de faculdade, que depois de muito insistir, ao ver a goteira interminável da varanda como infiltração, não quis entrar. Depois reformamos, ficando apenas uma terna rachadura no piso da cozinha, para nunca esquecermos quem somos e nos diferenciar de todos aqueles que não queiram se misturar com pessoas como nós, que vêem imagens de coisas, como seres e figuras em par

Vozes- Renê Paulauskas

 Uma voz sem voz, uma voz marginal. Como a dos negros, dos pobres, dos doentes mentais. Que dizem coisas, dores, que ninguém quer ouvir. Que os brancos, bem nascidos, racionais não querem escutar. Esses mesmos que são racistas, exploradores e normais. Desumanos e imorais.

Fama - Renê Paulauskas

 Moscas. Devem ser moscas o que aparece depois de se fazer sucesso, milhões delas. São olhares fixos, espantados e pessoas prontas para arrancar pedaços.

Pastel- Renê Paulauskas

 Algo acontece quando se vai  chegando numa certa idade. As roupas são cada vez mais discretas, como se fossem perdendo a cor e sua voz antiga, a da juventude. Dão lugar a um pastel pálido e sem vida. Mas o pior não é a roupa, é a falta de vida que vestimos como se fosse natural. Com o tempo a perda da juventude, da beleza se juntam a uma vida apagada e sem graça.

Refúgio - Renê Paulauskas

 Era muito quieto, muito calado. Andava olhando pro chão. Até que floresceu violento, rindo, falador. Mais forte, confiante, vivo! E assim namorou mulheres, viajou sua terra, fez amigos. Agora, vinte anos depois, estava só. Já não tinha a mesma força nem autoconfiança. Queria um refúgio tranquilo, sem precisar brigar. 

Fugiu- Renê Paulauskas

 A poesia fugiu Calou as bocas das pessoas  Mal o sol nascia já era noite A lua subia já era dia Algo nascia e morria Velho se era desde novo Novo também mesmo velho  Mas sem memória  Assim nem velho nem novo Tudo se era sem nada ser A flor abria e já fechava A lua nova, a lua velha Nada se escrevia Pois nada importava Nem rimava  O rio tudo levava O vento que dispersava O nada tudo esbarrava  E nesse silêncio  Morri a vida.

Pombas! - Renê Paulauskas

 Cansado de jogar no lixo tantos corpos de pombas mortas pelo gato do vizinho. Maldito gato! E deixa sempre nos mesmos lugares, já acostumado a matá-las na minha casa.

Então - Renê Paulauskas

 Eu só queria sair um pouco, mas a chuva não deixou. Pensei, não sou feito de açúcar, posso ficar num lugar fechado, ver um pouco de gente, mas a pandemia não deixou. Então fico só em casa, que pelo menos chova, então! 

Mergulho- Renê Paulauskas

 Mergulhai na onda do desatino, verás como é profundo. Driblai a loucura maligna, essa que te acorrenta. Sede são sempre, mas não nega o tesouro que encontrou.

Sofá- Renê Paulauskas

 Domingo, desaguo no sofá junto a chuva lá de fora. Não, amanhã não vou trabalhar. Quando trabalhava era feliz. Primeiro como assistente, depois desenhando tantas caras diferentes. Era a vida. E sobrou isso. O velho sofá.

Trauma- Renê Paulauskas

 O trauma, a ferida encoberta, repousa na tarde de verão. Lusco fusco relaxa meus ombros. Tudo há de passar. E somente a tarde e suas luzes hão de ficar.

Conflito - Renê Paulauskas

 Conflitos, que nos tiram a vóz, quando não nos fazem gritar. Decai o mundo nas nossas costas, traídos e incompreendidos. Aflição na pele que paralisa. Rompimento de acordo por um decreto. Fagulha de desespero engolido. Conflito, algo não resolvido, as vezes nem relatado. Aflito, sumo no mundo, meu mundo escondido.

Sidarta- Renê Paulauskas

 Sidarta, filho do rei, fugiu de seu palácio. Do lado de fora encontrou a fome, a miséria, a dor, física e espiritual. Achou ele na prática da meditação e do desapego o caminho do meio. ''Sidarta, não é possível meditar com fome. Não é possível praticar o desapego quando se falta o básico. Não é possível o equilíbrio quando se está sofrendo de dor.'' Portanto só se consegue o equilíbrio combatendo a fome, a miséria, e as dores físicas e espirituais pra depois, se quiser, meditar. 

Esse cara-Renê Paulauskas

 Da euforia se fez a calmaria. Da violência se fez o repouso. E agora ele era só, pois não haviam mães que se ocupavam dele, já tão crescido, tão cuidado. Ele já não uivava pra lua, ficava dentro de casa. Mas gostava do inusitado, de passear com os amigos, de viver. Mas a ansiedade estava menor. Então compunha menos, escrevia menos, não desenhava mais de um ano. Tudo porque não se angustiava tanto com o não fazer nada. Quase meditava. Ficava calado, pensando pouco, se acalmando já tando calmo. Foi me tragando, mas sempre que podia eu fugia. Pois desconheço esse aí, nem sei do que é capaz!

Olhos do lado de fora- Renê Paulauskas

 Meus olhos estão do lado de fora. A confusão se desfez dentro de mim. Minha aventura agora terá de ser outra. Calmo, atento, agora volto a ser do mundo. Mundo esse que tempos atrás me devorou.