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Mostrando postagens de junho, 2023

Espelhos- Renê Paulauskas

 Este ano de 2023 a filhota está com 22 anos, estudando no cursinho e trabalhando no mercado. Minha irmã está com 33 anos, trabalhando bastante com produção teatral e fazendo alguns bicos como atriz. Eu estou com 44 anos, na maior parte do tempo em casa, ajudando com as tarefas, escrevendo, desenhando e compondo. Mamãe está com 66 anos, cuidando da casa e atrás de sua aposentadoria. O que todas essas idades espelhadas querem dizer, eu não sei, mas achei importante aqui registrar. Justamente as idades das Laras, metade minha e da minha mãe. Talvez daqui se desfaçam as coicidencias, cada um tome um rumo. Eu por mim, e sinto ligeira satisfação, por ter contribuído para vida da minha filha, ainda mais sabendo que está bem.

Trabalho- Renê Paulauskas

 Hoje estou em casa. Um bom domingo para descansar. Amanhã não trabalho, o mundo também não deveria trabalhar. Ou apenas poucas horas, mais tempo livre do que trabalho. Quando tinha dezessete anos trabalhava como assistente de um cartunista de que eu era fã. Mal via a hora de chegar segunda feira para aprender coisas do ofício. Era muito bom, aprendi muito. Trabalhar deveria ser isso, ou quase não trabalhar. Depois de adulto, após passar quinze anos fazendo caricaturas, e hoje, estando dez anos quase parado, não tenho muitas ilusões em relação ao trabalho. Tentei algumas vezes entrar no meio editorial como ilustrador, e percebo, é um meio muito fechado, onde as relações sociais falam mais alto que o talento muitas vezes. Meu pai era ilustrador. Se tornou por ter contatos que o indicaram para o serviço, mas tinha muito talento também. Eu o ajudei a ilustrar vários livros, antes e depois de ser assistente do cartunista Spacca. Meu pai falava pra mim: "Você tem que tomar um café com

Surto, delírios e confusões- Renê Paulauskas

 Às vezes parece que o mundo sabe mais de mim do que eu dele. E me sinto num labirinto sem saída.  As horas atropelam os que estão aqui com a força e precisão das máquinas. A gravidade faz pressão sobre as peles frágeis. Corpos sedentos tentam se livrar do encadeamento de funções pré programadas. A máquina pensa: Sou eu ou é você?

Artista- Renê Paulauskas

 O grande erro sempre é tentar mostrar um cubo para quem enxerga em duas dimensões. Eu gosto de compor letras com melodia, normalmente só acompanhadas de uma batida para dar o ritmo. As gravo como registro apenas, mas consigo imaginar em outras vozes, com instrumentos, assim e assado. A maioria das pessoas, tirando os músicos, não consegue. Do mesmo modo já mostrei a peça que escrevi em 2015, sobre loucura, e, tirando os loucos, pouca gente entendeu. Teve até gente que disse que não lia peças, apenas ia ao teatro. Com relação aos meus desenhos, fico mais tranquilo, é onde me sinto mais seguro, inclusive para mandar naquele lugar quando fazem alguma crítica. Fico pensando o mal que o grande zoologo e compositor paulistano Paulo Vanzolini passou ao tentar mostrar suas músicas cantando e tocando mal. Fico pensando ainda como seria ruim, para todos nós, caso não insistisse às tornando conhecidas.  Outro lado perverso é a auto crítica. Só de pensar que o celebre Kafka, pediu a um amigo para

Invisível (ensaio) - Renê Paulauskas

 Do mesmo modo que quatro lados iguais formam um quadrado e um cubo é formado por seis quadrados, não se pode dizer que um quadrado e um cubo são a mesma coisa. O discurso passa pelo mesmo processo. Não se deve interpretar um discurso por apenas um trecho. O grande problema das redes sociais é que são definidas não por seus usuários, mas sob um número definido de discursos que pensam pela maioria. Dessa forma o usuário comum é vítima, sem se dar conta, perdendo sua identidade pessoal em troca de uma que já vem pronta, bem acabada e efetiva. Relacionamentos são desfeitos, brigas iniciadas, tudo ministrado apartir da ordem egemonica dos discursos polarizados. Que guiam a massa ignara, dessa vez, se achando dona da razão. O cancelamento social se dá pela mesma maneira. Quando passamos a ser integrantes de narrativas prontas só para nos sentirmos fazendo parte de algo correto? Essa polarização via redes sociais foi implantada no Brasil nas eleições de 2018 depois ter eleito o presidente Tr

Minha irmã e as palavras - Renê Paulauskas

Minha irmã mais nova começou a falar muito cedo. Com ainda um ano, no colo de nossa mãe, disse: A lua não parece um queijo? Já maior, na pré escola, a vi conversando com uma colega de um jeito tão complexo para uma criança de quatro, cinco anos, que fiquei meio assustado. No ginásio defendia os colegas injustiçados, nessa época nossa mãe imaginava que ela seria diplomata. Quando entrei na faculdade, era ela, do ginásio, que fazia a correção ortográfica dos meus trabalhos.  Mas por desvio do destino, fui eu que, por prazer, mais acabei exercitando a escrita na nossa família. Não que não acredite no potencial da minha irmã, mas acho que talvez, por ela ter tido o domínio tão cedo, seja pra ela, menos mágico do que é pra mim. Talvez, do mesmo modo, fez-se o destino meu pai ilustrador e eu, que começara tão cedo a desenhar, encontrasse nas palavras e nos sons um modo particular para me expressar. A arte tem mais a ver com a vontade do que com a técnica funcional. E sobre minha irmã, ela vi

Ideia- Renê Paulauskas

 Ele tivera uma ideia genial, será que era genial mesmo? O problema é que não tinha pra quem contar. Sua imaginação criara um utensílio erótico que faria mulheres e homens terem orgasmo juntos, uma invenção revolucionária, em vista que a maioria das mulheres não gozam na relação. Morava com sua mãe evangélica, afastado da sua ex mulher e filha há quase duas décadas. Estava na meia idade, a maioria dos seus amigos, também. Sexo era uma coisa que ainda povoava sua mente, mas relação com mulheres já não tinha há alguns anos. Pensou em registrar a patente de sua invenção, mas caso alguém ficasse interessado em produzi-lo, poderia ficar anos até que fosse descoberto como algo realmente útil. E teria que pagar anualmente e estava duro.  Antes de tudo precisava fazer um protótipo e ter a comprovação de algum casal. Um não, muitos casais. Então foi brochando, brochando... Até esquecer a ideia, ligar o computador e assistir a mais um filme pornô.