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Mostrando postagens de 2019

Viver- Renê Paulauskas

Quero quebrar e sair inteiro. Me aventurar sem sair daqui. Olhar as coisas escondidas no nada. Anoitecer de manhã, amanhecer de tarde. Mas existem máscaras. Camadas infinitas de bom teatro. Fechaduras. Segredos. Quem desvendará esses nós? Quem tem as chaves? Na maior parte do dia, autômatos. Piloto automático. Fluxo. Civilização. E o índio ouvindo ruído. Desvendar. Escolher. Viver.

Bom natal- Renê Paulauskas

Neste natal me solidarizo com todos os sem famílias. Os detentos, os doentes mentais trancafiados, os asilados, os exilados, os moradores de rua, os viciados, às prostitutas, os travestis, gays excluidos da família e à todos e todas que neste momento estão separados de suas famílias ou nunca tiveram uma família estruturada. À todos um bom natal. Que resistamos a este dia como um dia de boa solidadriedade humana em tempos difíceis.

O olho e a visão- Renê Paulauskas

Aqui na Terra, nos animais, inclusive no humano, tudo é dividido. Existe o corpo físico, seu organismo, sua química. Do outro lado, sua personalidade, sua psicologia, cultura e espiritualidade. O organismo molda o segundo como um tempero, temperamento. O segundo molda a pessoa à sua hera e às suas afinidades, se tiver escolha. Um não existe sem o outro. Um é o olho e o outro a visão.

Buscar- Renê Paulauskas

Buscar valhe a pena quando se vê os resultados. Pelo menos tem sido assim comigo no quesito, relações sociais. Tudo porque meu melhor amigo arrumou uma namorada e não tinha quase tempo se quer pra ele. Assim fui me virando como podia. O resultado foi uma ampliação da minha rede social, conhecendo pessoas novas, mas sobre tudo, fortalecendo laços antigos. Quando já tinha deixado meu melhor amigo em paz, ele aparece em casa. Falo das novidades e me sinto bem em ver quanta gente interessante, novos contatos, antigos amigos, vi nesse período.

Sem trégua!- Renê Paulauskas

O pulsar animal humano não é mais humano. Virou máquina, negócio, exploração. O capitalista querer sempre mais não é novidade. O conter, tentaram vários. O extinguir, já pensaram. Até que seja exigido que todo, ou toda, capitalista devolva à sociedade tudo que roubou dela mesma através do acumulo de capital por meio da exploração do trabalhador, e volte a ser humano, não sossegaremos!

Ciência-Renê Paulauskas

A memória, não é perfeita. A interpretação, traiçoeira. Quem sabe a razão pode estar doida. Ou haja lucidez na loucura. Desde que não seja um idiota estilo acadêmico. Quem sabe o muro se rompa. Haja menos regras, mais beleza. Mais verdade, menos certezas. Quem sabe já mudou o mundo milhões de vezes e só falta você saber.

Lado de fora- Renê Paulauskas

Tristes não são os trancados do lado de fora, são os que trancam. Muitas histórias ouvi da solidariedade dos que vivem nas ruas. De suas leis, de sua ética. Já aqueles do outro lado dos portões, não digo nada. Um amigo morador de rua me confessou uma vez que tinha preferido as ruas à sua família. Que com todas as dificuldades, está melhor assim. Que sua família é de evangélicos fanáticos. Por isso preferiu sair de casa. É uma pessoa tranquila, amorosa e sorridente. Penso em quantos como ele. Mas não sinto pena dele, ou de nenhum outro. Sinto pena dos que não os enxergam. 

Conjugação- Renê Paulauskas

Se ela aparecesse talvez eu melhorasse. Mas ela não vem, não porque não quer, de quem já foi e não é mais. Porque ela se quer existe. É mera especulação. Sendo assim, eu vou. Fosse o contrário seria mais simples, de fato. Mas não é. Então saio daqui a pouco, esperando o que houver, pois sei, que melhor que esperar ou imaginar, é agir e atuar.

Contra a corrente- Renê Paulauskas

Na cidade grande o ''eu'' parece maior do que ''outro''. Existe o individualismo. O resto não é visto como gente, são somente ''serviços'' para nutrir a um ego solitário errante. Desse destratar, desidratando a humanidade, funciona o motor da cidade. Dessa catástrofe feita encima de um capitalismo arcaico, o ser humano tenta continuar humano, mesmo lutando contra a corrente.

Tapete de areia- Renê Paulauskas

Atrás de um por-do-sol tem sempre um nascer do sol. Coisas vão, outras vem. É desse complexo quebra-cabeça nossa vida. Seja budista. Como quem se despede de um longa pintura de areias coloridas após ser levada pelo vento. E em seguida começa a pintar outra. Falar é fácil, eu sei. Mais fácil quando chega a novidade.

Leveza- Renê Paulauskas

A gente é feliz quando é aceito, e pode amar com leveza. Tem sempre alguém contrário, no lugar errado, que não é feliz, pelo menos naquele momento, com aquelas pessoas. Mas isso passa. É verdade que antes de se achar tem de se perder. Mas depois, tudo fica mais fácil, mais leve.

Que medo- Renê Paulauskas

Tenho medo da ''Pompeia sem medo''. A classe média em peso desfilando com seus cachorros todos iguais. Os cachorros identicos, uns dominando os outros, subindo, copulando, exercendo poder. E o dono lourinho ainda criança falando: ''Isso, Tobi, porrada!''. No evento, o único negro estava lá para entreter os brancos. Foram todos aprender maculelê, onde ouvi um dizer: ''Aqui só tinha mendigo, temos que ocupar essas praças''. Onde todos se conhecem e não cumprimentam estranhos. Tenho medo!

Envelhecer- Renê Paulauskas

Depois de certa idade percebi que nada mais vinha de graça, tudo era luta. E como quem perde a vida, fui encolhendo, ficando pequenininho. Já não tinha rosto. Já não tinha sexo. Era como um ser deficiente. Com o tempo fui ficando sem voz também. Era um estorvo, um inválido. Até me largarem aqui, esse quarto esquecido. Envelhecer é realmente uma bosta!

Caolho- Renê Paulauskas

O preconceito me olhou. Me pôs uma máscara. Em seguida desviou o olhar. Esse olhar caolho, errado e certeiro. Tantas vezes esse preconceito me furou os olhos, hoje, ele me olhou. Me maltratou um pouco, só um pouco. A ponto de me fazer sentir ódio. A ponto de fazer eu tirar a barba mal feita, vestir uma camiseta menos larga. Mas não foi só comigou. O preconceito tapa muitos olhos, vestindo à todos como bem quer.

Os quarenta- Renê Paulauskas

Eu pensei que aos quarenta ia expandir, mas descobri que é mera expansão por constatar um desolado recrudecimento, tanto de energia como de perspectivas. É como nadar contra as correntezas, mas fraco. A mente, congelada no tempo, ainda é jovem, mas o corpo perdeu vigor. Uns mais, outros menos, mas todos desesperados para alcansar a outra margem do rio como uma grande vitória. Eu, que nasci velho, envelheci jovem, hoje, honestamente, não estou muito feliz com a minha condição.

Breve- Renê Paulauskas

No fim da minha juventude, com 29anos, tive um caso com uma escritora casada com um professor de literatura. Dessa aproximação, tanto dela, como de seu marido, nasceu uma amizade entre artistas que tinham em comum o prazer de desenhar, esculpir e escrever. Meus primeiros incentivos à escrita devo a esse casal. Um grande amigo da época, também escritor, a conheceu, e se apaixonou. Esse período terminou com o fim das quatro relações envolvidas  e marcou nossas vidas com profundos ressentimentos. Olho para trás, vejo quantas coisas boas vivemos naquela época. Quão destemidos éramos, jovens e ignorantes. Mesmo assim, sabíamos amar. Nunca mais nos vimos, pelo menos, não com a mesma franqueza. Só para você ter uma ideia, demorou mais de dez anos para escrever esse breve texto. Gostaria de vê-los denovo, mas não como seria, depois da distância de mais de dez anos. Como se fosse possível voltar no tempo, mas sem ser tão ignorante. Por esse motivo, esse evento marca a passagem do fim da mi

Vermelho- Renê Paulauskas

A camiseta vermelha sobre a bermuda, lembra sangue. Pomba ferida, quer voar mas não pode. Somos atacados constantemente, até pelos que se sentem perseguidos. Sangue! Até quando vamos nos odiar, dar o troco? Olho por olho, dente por dente, deixou a humanidade cega, já dizia Gandhi.

Equilíbrio- Renê Paulauskas

Em casa reponho as energias. O mundo lá fora as suga, como fogo pegando em papel. É preciso se cuidar. Mas é lá fora que o mundo gira, as coisas acontecem. Não dá pra só se esconder em casa. É preciso um equilíbrio. Éssa talvez seja a parte mais difícil.

Aprender- Renê Paulauskas

Deus me livre de ser doutor e ter mais certezas do que dúvidas, um burro com certificado. Quero estar sempre aprendendo sem precisar passar na prova. Estudando coisas inúteis que só tem sentido pra mim. Me moldando, me descobrindo. Ser uma criança, não importando a idade.

Pipoca pós-moderna- Renê Paulauskas

''Pipoca aqui, ali, pipoca aqui. Desanoitece a manhã, tudo mudou'' Pipocam novamente novas ditaduras na América Latina. Dessa vez com a tecnologia de manipulação das massas através do controle da grande mídia e de disparos em massa de fake news. Essa estratégia, chamada guerra híbrida, se mostrou mais eficaz do que o controle pela força.

Abuso sexual infantil- Renê Paulauskas

Milhões de crianças são abusadas sexualmente no mundo inteiro. Normalmente por parentes próximos, vizinhos de confiança, ou pessoas próximas. Isso gera um trauma indissolúvel pro resto de suas vidas, paralizando pra sempre esse momento em suas cabeças. Desconfiança no próximo, insegurança, tristeza, são características típicas pós trauma. Podendo retardar o desenvolvimento natural de sua sexualidade, assim como a paralizá-la nesse período da vida, causando possíveis fixações em indivíduos da idade em que foram abusadas. Esse processo é muito doloroso e só passa a ser parcialmente resolvido, quando passado pelo período, ou períodos, de conscientização e luta para vencer o trauma e ter uma vida normal. A pessoa acometida desse tipo de trauma, se culpabiliza pelo ato, tendo muita vergonha, o que dificulta o processo de poder falar sobre o ocorrido.  Tabu e proconceitos só atrapalham nesse processo, às vezes paralizando ainda mais. Mas em muitos casos há uma significativa melhora se  bem t

41- Renê Paulauskas

Agora, perto de fazer 41anos, vejo as coisas um pouco diferentes. Não perdi o interesse pela vida, ainda gosto de rir como era jovem. Mas tenho menos pressa. Já vivi um pouco um bocado de coisas para saber que nada vale tanto. Não desisti de viver, apenas estou mais cansado, calejado. É triste, mas começo a acreditar que não terei mais grandes alegrias, que não seja uma vida tranquila, sem grandes sofrimentos.

Portas- Renê Paulauskas

Abro portas, uma parede tapa a passagem. Abro outra, dezenas de objetos perfurantes. Respiro, deixo passar. Olho o dia ensolarado, sem portas para abrir. E o que é esse labirinto, onde os outros são portas? No canto da sala, com sua porta aberta, escrevo.

Celulares- Renê Paulauskas

Como viver o mundo se está do avesso? Eu mesmo, dentro deste ônibus voltando pra casa, tantas vezes voltei conversando com vizinhos, ou até desconhecidos, hoje sozinho escrevendo pra você deste celular. Volto de uma aula que tentava ensinar como seria bom se entendessemos nós e mundo como uma coisa só, como pensam os índios. Em vez, cada vez mais fragmentados, vazios. Acabou de sentar uma mulher ao meu lado. Ela também está no celular.

Prece- Renê Paulauskas

Quando quero muito alguma coisa, peço a Deus. Ele sempre dá o que foi pedido. Mas tomo muito cuidado ao pedir, pois ele entende tudo ao pé da letra, não adivinha nossos desejos. Uma vez pedi uma namorada, não muito bonita, pra que tivesse outros valores, mas isso não falei na prece. Veio uma mulher feia, que se achava linda. Pedi também que trabalhasse com eventos, pensando que ela poderia me agenciar. Resultado, ela de fato trabalhava com eventos, mas não queria misturar a relação pessoal com a profissional. Por fim, pedi que fosse meio maluquinha. A mulher tinha surtos comigo todo mês não durando seis meses nossa relação. Então é isso, Deus sempre atende as minhas preces, difícil é traduzir pra ele o que realmente eu quero.

Garrafa- Renê Paulauskas

A mensagem está dentro desta garrafa. Ouça-me, leia-me. E mostre algo, para que eu tenha o mesmo privilégio. Mas correntes marinhas são traiçoeiras, às vezes mensagens são esquecidas, ignoradas ou nunca encontradas. Às vezes até, não traduzidas, compreendidas ou lidas. Mesmo assim as mando, daqui da ilha. Onde ficaria louco se não as mandasse.

Mendigo não! Eu tenho nome- Renê Paulauskas

Me perco num átimo de segundo, me acho no vazio da cidade fria, atravessando a floresta da minha cabeça. Me movo no chão duro, até encontrar o conforto entre a reta do meu corpo com o horizonte. Mas sempre algo me dá um soco de realidade. O vento gelado, as formigas, sem contar os fardados que chutam, nos levam as roupas, quando não nos matam. O único jeito de dormir é apagar. Seja o álcool, a pedra, que nunca tem esses nomes na quebrada, mas pra vocês faço uma dublagem. Viver na rua não é escolha de nínguém, é a falta dela.

Vapores- Renê Paulauskas

Quando brotaram os primeiros vapores, deixando o ar morno e úmido, tudo era mágico e novidade. Mas fora só segundos, que fizeram parar o tempo. Em seguida o tempo agiu rápido junto à aridez do mundo. Racionalizei e me afastei daquele instante como algo reprovável. Depois fui entender que o que me conduzira naquele dia fora um gesto. Um gesto limpo que me dava base de sustentação para outras coisas. Ou teria interpretado assim. Mas declinei. Esperaria outros gestos em outras pessoas que estivessem mais ao meu alcance, ou em circunstâncias mais afáveis. Mas ainda sim sabia que o gesto poderia me tocar, fosse ele por quaisquer gênero ou orientação fosse ele feito.

Solidão- Renê Paulauskas

A vida é solidão que vem, solidão que vai, solidão que volta. Fragilidade de um corpo mortal em meio a cidade grande que te devora. Não poder se firmar, se não em outros. Não poder ser só, ter mais a aprender. Mas existem aqueles, que tão sós, falam consigo em voz alta. Exaltados já não enxergam quase ninguém, por serem invisíveis a muito tempo. São chamados de mendigos, loucos, indigentes. Ficaram sem quem os ouvisse tanto tempo, agora nínguém tem corágem de os escutar.

Lula livre!- Renê Paulauskas

Lula foi solto. Depois de muita luta, o que já parecia impossível, enfim aconteceu. A ficha ainda não caiu totalmente. Queria ir pra rua comemorar, mesmo com essa chuva em São Paulo. Voltar a sonhar. Imaginar pretos, pobres, minorias galgarem direitos. Num futuro existir menos diferenças sociais. Menos privilégios dos mais ricos. Agora com Lula solto é hora de voltar a sonhar. Evoé Luis Inácio Lula da Silva!

Mosca- Renê Paulauskas

Passo, precipício. Renasço, eterno retorno. Eu já morri, renasci muitas vezes. Sou como uma mosca presa numa redoma de vidro. Nasce da larva de outra mosca, até virar mosca e deixar outra larva antes de morrer. Redoma de vidro, você não é o mundo, só a jaula à que venho perecer. Quebrai o mundo, quebrai! Pra que outros mundos venha a mosca conhecer.

Perfeccionista- Renê Paulauskas

O artista perfeccionista busca um equilibrio que não tem. Procura algo para apaziguar a falta, a dor e demônios. Debruçasse com empenho nessa tarefa, mesmo às vezes sendo preguiçoso. Chega a ser ansioso para conseguir alcansar tudo aquilo que vem a sua mente, mente essa, desequilibrada.

Telhado de vidro- Renê Paulauskas

Derrepente as pessoas parecem estranhas. Uma mancha às escurece e sinto medo de sair à rua. Todos parecem perigosos, como eu. E o que ganho com isso, além de desconforto? Ninho de cobras. Rezo para me aliviar, depois penso, que atire a primeira pedra quem não tem telhado de vidro.

Sofá- Renê Paulauskas

Eu fui louco, mas um louco cosciente. Nunca perdi a razão, a ampliei até onde pude, aproveitei ao máximo cada abertura de cosciência afim de me tornar mais sábio quem sabe. Assim, descobri coisas, segredos, que nínguém acreditaria. Por isso mesmo parei de contar. Mas não deixei de acreditar, fui só parando de falar. Depois, de bastante tempo, fui me acomodando no sofá, com todos os móveis em volta, a TV ligada, e fui parando de sonhar. O mundo envolta foi solidificando, de fora pra dentro até a sala e fiquei preso no sofá. Quando vi já era tarde, tornara-me preso de um pesadelo criado por mim para acordar. Despertara no pior momento que o mundo estava, mas levantei-me do sofá.

Passagem- Renê Paulauskas

Viver com intensidade é viver um dia intensamente e descansar duas semanas. É mais, alcansar os céus, e passar mais de uma década em expiação por desvendar o proibido. Que esse mundo é muito careta, cheio de regras, mesmo que não as veja. De certo modo tem um sentido: O de dar reintegração física e espiritual aos que estão aqui de passagem.

Alguém- Renê Paulauskas

Abri as portas, deixei o ar circular. Tudo estava limpo, até o ar. Respirava, entrava e saia vida. E à meia luz fui me acalmando. Tudo por causa dela, que elgiou o meu poema. É incrível como a vida pode vir de onde menos se espera. Mas não a conheci, trocamos poucas palavras. Amigos em comum, pintora como, logo fui embora. Não era ela, mas sim o toque de quem tinha sido tocada, justo o poema solitário.

Frankeinstein- Renê Paulauskas

Junte a sabedoria de um louco, que sabe as coisas do mundo, mas se cala pra não ser encarcerado, à consciencia maternal da mulher brasileira, mulher que foi abandonada pelo pai da criança, que criou o filho sozinha, só com o apoio de outra mulher, sua mãe. E tudo isso à resistência do jovem negro, que sempre lutou desde tempos de escravidão, hoje resiste ao preconceito se virando como pode, na maioria das vezes longe das estruturas da elite e classe média branca. Juntá-se tudo isso, dá um perfeito revolucionário. Um Frankeinstein revolucionário! Imagine agora um exêrcito deles.

Normal- Renê Paulauskas

Dentro de mim há vários. Às vezes um estribilho vem de dentro, como uma voz, mais rouca, meio assustadora. Mas como ela vem ela vai. E tudo continua normal.

Estera- Renê Paulauskas

Cansado de sair por sair. Ir em saraus desconhecidos, beber em bares conhecidos, e no final, voltar quase sempre meio vazio, sem novidades. To me poupando pra algo que valha mais a pena. Cansado de correr em estera.

Envelhecendo- Renê Paulauskas

Envelhecer é um processo natural. Os homens vão criando barriga, as mulheres perdendo a cintura. Quando se tem filhos e eles começam a chegar à vida adulta, fica claro que já não somos tão jovens. Mas continuamos vivendo. Sentindo, errando, buscando. Esse é o processo natural e saudável de envelhecer.

A vida- Renê Paulauskas

A vida é assim: às vezes um peso quase maior do que dá para carregar. Até que tudo começa a dar certo, uma beleza! Daí, tudo voltou ao normal e o negócio é seguir enfrente.

Espelho vazio (filosófico) - Renê Paulauskas

Um solitário na multidão é mil vezes mais solitário de quem está em casa, tranquilo. A falta de contato se multiplica em cada não contato. E reflete um vazio que é maior ainda, o vazio da grande cidade. Esse buraco é dilatado por onde passa o transeunte refletido em outro, anônimos como ele. Imprimindo o vazio do não relacionar-se em sua face frente ao espelho.

TV- Renê Paulauskas

Não aguento mais conhecer o mundo pelo Globoreporter. Melhor ir até Sapopemba pela TVT. Ou passar o domingo na TV Cultura. Como TV é importante na terceira idade. Pelo menos escrevo quando ela está desligada.

Descansar- Renê Paulauskas

Melhor ficar em casa, descansar. Deixar passar todo mal estar. Aproveitar que hoje não tem lua nem sarau.

Sangrando- Renê Paulauskas

Sei que ainda é cedo para sair, que deveria antes cicatrizar os ferimentos, repousar. Mas a sede de viver é muito grande. Prefiro viver sangrando que morrer em vida.

Lutar- Renê Paulauskas

Quando vejo defeito nos outros, me afasto. Quando vejo em mim, me calo. Ninguém é perfeito eu sei. Porém, é preciso se afastar do pior, fazer de tudo para melhorar. Ou, se não, não há motivo pra continuar.

Recomeço- Renê Paulauskas

Depois da enchente me mudei pra uma casa menor. Móveis só os necessários. Os potes vazios, as roupas que não usava, joguei fora. Levei só o estreitamente necessário e alguns itens que admirava. Para um recomeço até que está muito bom.

Pote- Renê Paulauskas

Vazio, opaco, rachado. Nosso pote quebrou. Mas quebrou com o tempo. Foi perdendo a cor, com o tempo ficou vazio, paciência. Que venham outros potes. Cheios e coloridos. Na vida existem muitos. Tantos, a ponto de ser injusto se importar com aqueles sem vida.

Mancha- Renê Paulauskas

Minha mão está manchada, é preciso cortá-la mas não tenho corágem. Antes, meus pés foram manchados, suas solas tingidas de um preto que por mais que andasse descalço não saiam nem que as esfregasse com força. Meus pés foram tingidos muito cedo, sem que precisasse. Desde cedo luto, e não passa. Já lutei com quase todos que me mancharam os pés. Mais altos, mais fortes, mais velhos. No caminho dei socos até em quem amei um dia. Hoje estou mais velho, velho pra lutar. Tenho que aprender outra maneira de brigar. Mais calmo, menos impaciente, mas ainda de solas dos pés encardidas, me controlo, pra não ser eu a manchar os pés de outra pessoa. Mas é difícil, é uma coceira constante.

Real?- Renê Paulauskas

Esse mundo artficial e programado às vezes parece incrivelmente real. Não importa quantas vezes tenhamos girado a roda, chegando nos mesmos caracteres e símbolos dentro de nossos circuitos, é uma sensação nova, única, pelo menos assim parece. Esquecemos de tudo e por poucos segundos, vivemos.

Amanhecer- Renê Paulauskas

Quando vivo não preciso escrever, basta gente viva como eu. Pra fazer tudo que o bicho homem pode. Tocar, falar, tocar. E o que transmite de eletrecidade, este contato E que tudo o mais desabe, toda estrutura decomposta, todo sistema falido. Mesmo em um gesto perdido num amanhecer, num sábado qualquer. Só pra dizer, estou vivo, e nada mais preciso.

Madruga- Renê Paulauskas

No meio da noite todos gatos são pardos. Janelas dão em portas, portais da madrugada. A novidade tira o sono, desperta a alma. Serenidade é fundamental nessas horas. Viajamos através das pessoas, seus mundos, nossos espelhos.

Sarau- Renê Paulauskas

Dispersos olhares gazosos. Obliquos, ligeiros, individuais. Até acender a fogueira. Focados no som, envolta o silêncio. Filhos, querendo peitos e leite etílico. Ares gazosos, de fumo e de cores. Mas no quarto ao lado, dorme uma criança morta.

Pomba- Renê Paulauskas

A pomba morta na entrada de casa não era um presságio, nem um avizo, era ela, a própria pomba, que não conseguiu voar, não conseguiu fugir, em pedaços, penas, víceras, membros espalhados.

Sonho-Renê Paulauskas

Sou filho de uma ditadura de um mundo dividido entre dois polos, comunismo e capitalismo. Quando nasci em 1978 no Brasil, já estavam preparando a anistia. Em 1985 foi o fim da ditadura no nosso país, com a vitória das diretas. Na redemocratização nosso primeiro presidente eleito foi o Fernando Collor, que saqueou a poupança do povo e foi impeachmado depois. Após veio seu vice, Itamar Franco, e depois eleito o Fernando Henrrique Cardozo. FHC controlou a inflação criando a moeda Real, mas entregou as estatais ao capital estrangeiro. Em 2002 o Lula foi eleito, daí seguiram 13 anos de desenvolvimento e consequente diminuição das desiqualdades pela primeira vez desde o meu nascimento. Tudo isso sem mexer nos privilégios das classes dominantes. Dai veio a descoberta do Prê-sal, a maior reserva de petróleo das últimas décadas. Ouve um golpe para tirar a sucessora do Lula do governo, Dilma Roussef. E estão fazendo de tudo para roubar o nosso petróleo e perdermos a chance de nos tornar um país

Intocado olhar- Renê Paulauskas

Você que era tão real se desfez. Virou água, pó, fumaça. Do sonho de encontrá-la sobrou somente seu olhar. E quanto mais real, mais distante fica sua face. Intocado olhar.

Cola- Renê Paulauskas

As coisas fixam em mim o tempo todo. Ficam horas, dias, anos. Devo ter uma cola que gruda tudo. Ideias, imagens, sensações. Queria ser liso, que tudo escorregasse sobre mim como água.

Sutil mundo cão- Renê Paulauskas

Loucura mesclada com premonição, loucura. Ideias insensatas para um mundo insensato. Injusto, governado pelos que não tem coração, psicopatas. No meio das incertezas, rastejo. Ansiedade desgovernada. Sutil mundo cão.

Silêncio- Renê Paulauskas

A mensagem afundou com a garrafa no fundo do mar. No meio do silêncio do oceano se decompos. Comida pelos peixes, esquecida, nunca lida. Quem diria que minha mensagem serveria de alimento no fundo do mar.

Dominadoras- Renê Paulauskas

Mulhetes dominadoras são diferentes de homens dominadores. Um pouco mais sutis exigem fidelidade e consulta sobre todas as decisões relacionadas ao casal. Odeiam não serem consultadas e pegas desprevenidas em situações que não concordam. Lembro bem da cara da minha ex mulher ao eu levar um colega caricaturista para passar uma noite em casa no dia em que seu apartamento pegou fogo. Ou até de uma ex namorada que quando me viu conversando com alguns amigos no lugar em que tínhamos marcado encontro não teve vergonha em fazer cara feia ou reclamar comigo depois.

Aprendi?- Renê Paulauskas

Aprendi. Aprendi que nesse mundo não adianta forçar as coisas. Não se força o amor, nem amizade, melhor mesmo é não forçar nada. As coisas tem um ritmo certo pra acontecer, muito mais lento e também dinâmico. Os acontecimentos se encaixam em acasos, os desencontros se perdem no tempo. A vida se encarrega de trazer o fruto e de levar as sobras. Mesmo sedentos, a vida dá um jeito.

São Paulo- Renê Paulauskas

Devolta! Ah, São Paulo, São Paulo das multidões. Onde tem de tudo, até a ausência sobra. Onde cada um é um mundo e mesmo assim insignificante. Minha cidade não é o mundo, mas meu mundo está nesta cidade.

Mal humorado- Renê Paulauskas

Voltando pra casa, de Itu para São Paulo, chego a uma conclusão notável: A humanidade tem milhões a mais de pessoas boas do que ruins, mas é governada pela pior faixa, aqueles que não tem humor.

Vida- Renê Paulauskas

Viver não é difícil, mas controlar a ansiedade de uma vida bem vivida é. O tempo ajuda, a ansidade dos quarenta anos é quase nula se comparada a dos vinte. Mesmo assim, aquele resquício, projeta mundos, sonhos. E é exatamente por esses momentos que chamamos vida e não apenas sobrevivência.

Insólito- Renê Paulauskas

Depois de acordar sem fôlego por ter esquecido de ligar o ar no quarto de final 66, minha viagem começa a ter ares insólitos. Mesmo assim vou dar uma caminhada, ver o que tem de bom nessa pequena cidade chamada Itu.

Piada de mal gosto- Renê Paulauskas

Discurso de Bolsonaro na ONU mente descaradamente criando vários bode expiatórios. Faz dos médicos cubanos que vieram trabalhar no Brasil, de médicos formados e capacitados em vítimas de trabalho escravo. Das ONGs que trabalham pra proteção das florestas e da Amazônia, empresas à serviço de outras nações interessadas não na proteção do meio ambiente, mas nos metais preciosos embaixo das terras indígenas. Seria para rir se não fosse ouvido e com risco de ser levado a sério pelo mundo.

Luto e luta- Renê Paulauskas

Ontem foi um dia de debates sobre o genocídio em amplos aspéctos no Ponto de Economia Solidária do Butantã, zona oeste de São Paulo. Falaram sobre os desaparecidos da ditadura, mas também dos sempre desaparecidos pretos da periferia. E um cacique que entrou por acaso no evento, falou da maior população exterminada, os índios. Terminamos o encontro na frente da casa do Dinho, liderança ali na região. Sua mulher após ouvir o cacique falar disse que ouviu de um indígena numa viagem que os índios do Brasil iriam ficar calados por quinhentos anos, e que agora, já tinha passado esse prazo. Fomos todos pra casa cansados de debater assuntos tão densos, mas fortalecidos e renovados.

Tempo- Renê Paulauskas

O que fazer do tempo quando temos tempo demais. Minha mãe dorme, muitos enchem a cara, há quem passeie, procure o que fazer, eu faço tudo isso e ainda me sobra um tempo absurdo. Antes assim do que não ter tempo pra nada.

Sagitario- Renê Paulauskas

Em breve irei viajar, depois de descansar dessa reforma. Faz muito tempo que não viajo. A última grande saída foi seis meses pelo Brasil. Dessa vez vou aqui pertinho, interior de São Paulo. Pra matar um pouquinho a saudade, e não perder o jeito. Afinal, sou um sagitariano.

Telhado- Renê Paulauskas

Estou cansado, exausto pra ser mais claro. Dum cansaço na pele, nos poros, na alma. Cansado a dias, semanas, a quase um mês. Mas hoje durmo. E quando acordar terá tudo passado. E terei um telhado novo. Até recomeçar. E ficar cansado mais uma vez.

Ditado pra mim mesmo- Renê Paulauskas

Destruir é mais fácil do que construir. Por isso, não perca tempo destruindo, deixe isso ao tempo. Também não tente construir um castelo atrás do outro para que desfaçam-se como areia. Aproveita a inspiração e aí movesse. De resto deixa ao tempo, só depois recolhe os destroços.

Vós sois Deuses- Renê Paulauskas

''Vós sois Deuses''. Quando falei alto essa fraze, com essa pronúncia arcaica, não sabia o que estava falando. Estava internado no pronto socorro psiquiátrico pela primeira vez depois do meu primeiro surto psicótico cheio de alegorias religiosas. Mas aquela linguagem, inacessível pra mim, naquele tom, provocou um verdadeiro choque nas pessoas que ouviram naquele instante, as deixando petrificadas. Hoje desconfio da possibilidade de ter recebido essa mensagem de algum espirito, talvez do próprio Jesus. O episódio passou, mas a mensagem ficou. Repasso alhures até além dos montes, amém.

Lobo do homem- Renê Paulauskas

Aquilo me pareceu monstruoso, a insensibilidade, falta de empatia. Mas era só humano. É que o ser humano é monstruoso mesmo. Um bicho diferente dos demais. Mais frio, egoista. Com a razão engendrada em papeis que nada tem a ver com a sensibilidade própria de outros mamíferos. O homem é o lobo do homem.

''Liberdade''- Renê Paulauskas

Às vezes é como fazer parte de uma experiência, rato de laboratório. Outras, transborda nos olhos algo, até ratos sentem. Nos controlam, olhos de todos os lados. Não somos livres, é tudo uma ilusão. Mesmo assim, quase vivos, quase livres, fazemos do quase nossa liberdade.

Desejos e intenções- Renê Paulauskas

Pode ser viagem da minha cabeça, mas às vezes parece que cada pensamento emitido produz uma consequencia física, seja no espaço ou um efeito colateral no próprio corpo. Uma espécie de comunicação direta dos nossos desejos e intenções.

Ela- Renê Paulauskas

Quando vejo uma mulher como ela, vejo o mundo novamente. Vontade de conhecer tudo denovo. De namorar, viajar, ter filhos, casar... Quando olho pra ela é um presente, um estar vivo.

Boxe- Renê Paulauskas

Apanhei, apanhei muito. Mas nunca me derrubaram, ou deixaram-me incosciente. Resisti, outras revidei. Mas sempre intocável, pelo menos aos meus princípios. Assim continuo lutando. Apanhando, mas nunca me curvando ao que não concordo.

Sambadas- Renê Paulauskas

Sambadas é um grupo paulista de samba só de mulheres. Fui em duas apresentações, ambas no final da Cardeal Arcoverde em pinheiros. É um local lésbico, por isso, quem não é precisa chegar de mansinho, respeitando o ambiente. O som é de primeira, vale a pena experimentar!

Criar- Renê Paulauskas

Para de pensar no tempo. O futuro é tão impreciso como seu pensamento. Um depende do outro, então pensa. Mas vive, se não de nada vale a pena. Cria o dia, e interage com ele.

Ser humano- Renê Paulauskas

O ser humano é aquele ser que mal se cura de uma ressaca, lá vai ele encher a cara denovo. Aquele que só vive o presente buscando o prazer, deixando de lado a razão, sem pensar em futuras dores de cabeça. Um ser irracional, que só pensa, depois.

Reforma- Renê Paulauskas

Dentre todas as possibilidades de passeio, a impositiva e concreta certeza da chuva num dia frio. Hoje, fico em casa. A calmaria, nesses dias de reforma, é tão necessária como procurar ar fora de casa.

Bicho- Renê Paulauskas

Quando acordei tinha uma pomba ferida no meu quintal. Moribunda, ainda viva, não voava mais. Entrei em casa deixando o animal em paz. Quando voltei vi ao seu lado o vil gato que a atacara. Dei um chega pra lá, mas sabendo que o bicho volta. O que fazer não sei. Estou meio preocupado.

Verdades em um mundo de mentira- Renê Paulauskas

Tudo no texto era verdadeiro, só o mundo que era invenção. Não o mundo escrito, mas o habitado pelo escritor.

Texto moribundo- Renê Paulauskas

Morre alguém como nasce num outro lugar.

Sala vazia- Renê Paulauskas

Passo pelos objetos calados em seus cantos, tão vazios, quase miragens de um solitário. Mesmo assim corro, me desloco no fluxo até voltar cansado. Sempre a mesma procura, cada vez mais escassa, se sentir vivo. Volto aos mortos, reconforto com uma mãe companheira, uma fiha amiga e poucos amigos. Pensando bem, a vida sempre pareceu bem vazia.

Morte encomendada ao presidente Lula- Renê Paulauskas

A decisão de transferir o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o presídio de segurança máxima de Tremembé, interior de São Paulo, tem interesses explícitos e implícitos. O motivo mais óbvio é o de, agora que a Lava Jato está sendo desmascarada, associar o Lula a um presidiário perigoso. No presídio de Tremenbé estão encarcerados os psicopatas mais perigosos do Brasil e do mundo. Negar uma cela particular num presídio dessa periculosidade, e incomendar a morte do ex presidente, num lugar onde a maioria está condenado por homicídios, pode ser um dos motivos implícitos.

Racismo- Renê Paulauskas

O racismo está entranhado em toda sociedade brasileira. Principalmente o de julgamento social. Aquele que teme o preto pobre da favela, mas que é refletido pelo professor universitário à subestimarem seus alunos cotistas, por exemplo. O preconceito está em acreditar que as classes dominantes são superiores às classes populares. E toda uma cultura de subordinação do popular ao clássico. Como um desprestígio do popular negro e periférico como algo perigoso. E em fazer esse tipo de associação a qualquer pessoa por sua cor.

Decantação- Renê Paulauskas

Hoje tá muito frio, ninguém sai de casa. Pensamos na vida, decantando aos poucos, até entendermos de fato.

Ilusão (filosófico) - Renê Paulauskas

Esse mundo é de ilusão, às vezes tão densas que provocam dores, feridas. Só o desapego nos afasta de certas armadilhas. Ciladas existem o tempo todo. É preciso saber onde se pisa. Quanto maior o desejo, maior o tombo.

Drogas- Renê Paulauskas

Drogas, pra que te quero? Me deste outra vida, mesmo que invisível. Me tira o desconforto do dia, mesmo de noite. Quando vejo, já não vejo nada. Sou guiado pelo desejo, que seca a boca e diz amém.

Monstros- Renê Paulauskas

De tanto deletar sobrou só a tela em branco. Que fazer se nada últimamente o interessava? Esperava um encontro, algo novo, que renovasse o ar. Em vez disso, monstros, tão pesados em seus corpos, cuspindo, arrotando e peidando, como se fosse a coisa mais natural. Estava difícil de encontrar ar fresco em meio a cheiros tāo desagradáveis.

Resíduos- Renê Paulauskas

Resíduos contaminados coçam minha pele. É preciso tomar um banho. Evitar as rotas contaminadas. Em quarentena. Esperando passar essa curta fase de lixo humano. Que ventos novos refresquem o céu.

Frio- Renê Paulauskas

O peso da minha cabeça retarda o movimento dos meus pés. Caminhando pareço não chegar a nada. Mas a paisagem muda, semana a semana. Chá, toca, blusa de frio. É difícil se esquentar neste inverno.

Sinais de vida- Renê Paulauskas

A vida parece retomar donde parou. Os semáforos se abriram. Já não faz tanto frio. E esse mundo não é nada do que esperávamos, ainda bem!

Em casa- Renê Paulauskas

Hoje não quero pegar trânsito, não quero pegar fila. No dia em que todos querem sair vou ficar em casa. Protegido do frio e das pessoas loucas. Tomando um chá com mel ou chocolate quente.

Lento- Renê Paulauskas

Tinha esquecido como é ser ''normal'', e ter que engolir todos os sapos agindo da melhor maneira, como se nada tivesse acontecido. Melhor nos afastarmos dos problemas, gente mal intencionada há em toda parte. Não perder muito tempo pensando nos problemas, também faz parte. Caminhando lentamente.

Enfim- Renê Paulauskas

Aceito denovo à vida, sua arte começara a falhar. Tocava o violão e nenhuma música boa para gravar. Escrevia em seu blogue e após, deletava. Que estava por vir? Será que enfim teria sido aceito ao mundo com todas chances de medíocres seres humanos mais uma vez? Certeza não tinha, podia ser só mais uma de suas ideias.

Walk- Renê Paulauskas

Fiquei, fiquei chateado sim. Quantos socos na cara mais vou levar? Mas estou me curando, ainda de ressaca. Sim, já limpei os meus contatos. Estou clean, light. Limpo, sem passado, pronto pra caminhar.

Vdd- Renê Paulauskas

Se na própria família encontramos gente que mal aguentamos. Que dirá lá fora, no meio desse mundão.

Insólito- Renê Paulauskas

Gente, o insólito se encontra dentro. Entre os parafusos, na perda auditiva da razão. Isso não quer dizer que não pensa. Pelo contrário, pensar demais às vezes tira o foco das coisas. E se alcança outras coisas, coisas essas anormais. Só vais ter assunto com outros tais, que foram além também.

Gente- Renê Paulauskas

Mar de gente. Gente que vem, gente que vai. Gente difícil de tocar. Gente difícil de se aproximar. Gente indiferente. Gente sorridente, que se dá. Gente que convida pra jantar. Gente que te toca pelo olhar. Gente. Gente que vem, gente que vai, gente que fica.

Ibernar- Renê Paulauskas

Hoje tem muita coisa, tem coisa alguma. Tudo que é sólido desmancha no ar. Vou me jogar de cabeça no sofá da sala. Sonhar com dias melhores. Inverno é bom pra ibernar.

Batalhas- Renê Paulauskas

Esse mundo é de batalhas. Índios caçados por colonizadores. Mas os vikins se pacifiraram, viraram o mundo desenvolvido. Guerra de informação. Guerra híbrida. Donos do poder. Daqueles que ganham quando perdemos. Só um chá pra acalmar os ânimos. Desse mundo cruel e humano.

Homem- Renê Paulauskas

Vil e patético é o homem, aos olhos do que ama. Sede tem, dá de beber. E quando escurece, volta pra casa e dorme. Mas tem receio de sair nas tardes claras de inverno. Medo desse bicho, homem. Que não ama. Só reclama sem ter a quem chamar.

À francesa- Renê Paulauskas

Às vezes falo demais. Outras sou mais ouvidos. Tudo depende. Se me acende o espírito. Ou se sou crítico aos dos outros. Uma hora protagonista, criticado e até mal visto. Hora, plateia. Do tipo que não faz barulho, e quando pode, sai à francesa de uma festa chata.

Cais- Renê Paulauskas

Vai, estrangeiro, antes de atracar! Minha vista continua procurando. É verdade que só tenho visto miragens. Vislumbre de vida em furtivas ilusões. Meu coração não basta, quer mais. Vivo assim solitário no cais.

Gênio- Renê Paulauskas

Às vezes fico horas pensando em antigas namoradas. Penso sobretudo naquelas que fui mais feliz. Nas que ainda sobrou um carinho. Mesmo eu tendo estragado nosso namoro com  meu gênio intempestivo, fruto da bipolaridade. Penso em como poderia ter sido feliz, se não esse jeito. Depois repenso. Nunca as teria conquistado se eu não fosse assim.

Fato- Renê Paulauskas

Nunca vamos saber, se foi real, se foi ilusão. O que pode ter sido real para mim pode ter sido ilusão pra você, ou vice versa. Em alguma dessas paredes iremos esbarrar. Por isso mesmo, frágeis. Sem saber o que foi de fato. O fato explica sempre muito pouco. A vida é a matéria entendida pelo espírito.

Ao Vinil- Renê Paulauskas

Ao enorme amigo, Vinil (Vinícius Teti Sila), que foi comigo um dos idealizadores deste coletivo, que hoje sobrevive como blog. Esquizofrenico, catatônico, quando fumava um, desatava a falar. Sua inteligência inspirava nossos ouvidos e mente. Era tão bom, que queríamos que não parasse. Infelizmente, após alguns cigarros, voltava lacônico. Enorme pessoa. Artista. Crítico. Desajustado. Queria que ainda estivesse aqui. Saudades do meu melhor amigo, Vinil.

Grátis- Renê Paulauskas

Eu tenho conhecido pessoas. Antes de estreitar um laço, conheço outra. E assim esquecendo o passado vivendo o presente. Apresento a eles minha peça, minha música. Apresento meu melhor. Espero ver frutificar alguma dessas relações uma hora qualquer. Mas que seja gratuita, como são todas relações que valhem alguma coisa nesse mundo.

Tapa olho- Renê Paulauskas

De todas pessoas que conhecemos, só se salvam de 3 a 5 porcento. A imensa maioria só faz o trabalho de sustentar e apoiar o sistema. Já fui um deles. Hoje, nessa vida de pirata, é mais difícil. Porém, mil vezes enchergar com tapa olho, que ser cego de óculos. Batalha, luta, temos que nos resignar. Mesmo assim, não há um careta que não tenha um pouco de louco. Nem um louco que não tenha um pouco de careta.

Assustada- Renê Paulauskas

Sei que muitas vezes não percebo regras sociais sutis porque internamente acho que não as tenho. Mas ver a cara de assustada da moça que há poucas horas pedira meu contato, quando me coloquei à disposição para procurarmos um banheiro, sendo que eu também estava apertado, me fez um tanto mal. Sei que grudei nela, afinal pediu meu tel para sairmos para ver ou trocar figurinhas sobre teatro. Sim, grudei. Enfim. Não grudo mais. Era tão bonita, foi simpática, confundi tudo. Mais sorte pra mim na próxima. Essa, já não tem volta. Mas aprender, sempre!

Regras- Renê Paulauskas

Onde estiver um homem que seja, há regras. Malditas, nos aprisionam, pelo menos nós, loucos, anarquistas, artistas, marginais. Seria tão bom o contrário, um mundo livre, criativo, sem pudor, sem regras. Teia invisível gritando, ordem! E travam nossos movimentos, nos colocando à ordem, na fila, às regras do trânsito. Queria voar.

Longe- Renê Paulauskas

Destrava, meu coração, tão carcomido pelo tempo. É tempo esticar os músculos, espriguiçar. Jogar conversa fora, flutuar. Sem medo da cortina dos carros, dos prédios vazios. Destrava, minh'alma. Melancólica, brisa do mar. Me leva pra longe, longe.

Valéria Dim- Renê Paulauskas

Somos todos Valéria Dim, porque puros, esquisitos e ingênuos. Imersos no sistema, sem poder ver ou prever suas engrenagens, nem ao menos podendo sermos donos de nossa própria história. Carentes, infantis, vítimas da sensibilidade tão subjugada na lógica do capitalismo.

Não é poesia- Renê Paulauskas

Sou um poeta de uma só poesia. Cria sonhos e trancafia. Come beiradas, é furacão. Sou um poeta com uma poesia. Vai em trincheiras, revolução! Flutua em miragens, desilusão. Sou um poeta sem poesia. Fala da vida em construção. Refugia o tormento em uma canção. Dispensa a rima sem pulsação.

Só- Renê Paulauskas

Tanta solidão, depois de ter excluido a garota do aplicativo. Depois de não sair com meu amigo numa sexta. Depois de ir pra rua sozinho, procurando o que fazer. Inquieto tentando me conter. Com comida, bebida, doces. Ninguém interessante pra conhecer. Somente o vazio no meio da cidade. Nenhum vento, nenhum alento. Somente só.

Imerso- Renê Paulauskas

Submerso catando algo no fundo do mar pra me alimentar. Cansado, lento, pensativo. A escuridão não me deixa enchergar. Mas acalma, o silêncio também. Sou algo imerso no todo e em mim. Lento, pensativo. Agora mais relaxado.

Valha-me deus!- Renê Paulauskas

Quando penso em relacionamentos, é alguma coisa que acontece, deslancha. Ou, não acontece. Infelizmente há muito tempo pra mim, muito pouca coisa tem acontecido. Sinto saudade dos meus dez anos de vida boa, dos 19anos aos 29anos. Vida, relacionamentos, trabalho. Tento me resignar a atual vida monástica, mas é difícil. Sinto falta de namoradas, amigos, trabalho. Sou o aposentado sem pensão mais novo que conheço. Valha-me deus!

Aplicativo- Renê Paulauskas

Entrei num aplicativo de encontro ontem, hoje conversei com uma linda jovem que me deixou muito animado por várias horas. Mas, sem motivo, parou de falar comigo, como deve ser usual nesse mundo líquido de encontros por aplicativo. Voltei a mim, desinstalei o aplicativo e de volta a solidão e inquietação como sempre.

TV- Renê Paulauskas

Tô meio enjoado de tudo e de todos. Preciso beber duma fonte qualquer que me rejuveneça. Tô ficando velho e chato. Às vezes nem eu me aguento. Falta um pouco de tudo. Vejo minha avó, com a televisão como única companhia, dá até medo. Ainda não cheguei nesse ponto, mas às vezes parece um destino certo. Fujo desse fim, mas ele me alcança quando ligo aTV.

Chuva- Renê Paulauskas

Diz o paulistano em sua casa, acompanhando as goteiras dentro de casa: ''Se parasse essa chuva talves eu saisse''. Pensa a alma penada: ''Se tivesse vivo concerteza tomava essa chuva!'''.

Draga- Renê Paulauskas

A vida é suja, não aceptica, milhões e milhões de bactéreas. Vivo limpo demais. Às vezes tenho repulsa dessa vida ordinária em que a todos pulsa como uma draga. Que age sozinha sem pensar. O impulso. Fatal. Natureza. Chama. Chamam isso de vida. Pode ser. Mas sem sutileza, é só uma catástrofe.

Des- Renê Paulauskas

Essa paisagem não sou eu! Desejos, engulo! Fantasias, desligo! Morto, vivo!

Cegos- Renê Paulauskas

Tanto tempo tentando sair com aquela garota. Tanto tempo investido, disperdiçado, pra agora que estou mais perto, perceber que ela tem tão pouco a ver comigo. Por que ficamos cegos? Por tanto tempo. Só para depois percebermos, que somos sozinhos o tempo todo, acompanhados ou não.

Buda- Renê Paulauskas

O Budismo é uma doutrina para alcansar a iluminação. Mas muitos se perdem, invez de se iluminarem, servindo ao Buda como um santo. Todo meu respeito ao Buda e a todos os santos. Mas se tivessem vivos aqui na terra, acredito que falariam, se concentra em ti mesmo e pare de me bajular.

Bichinho- Renê Paulauskas

Eta bichinho tinhoso que come a gente por dentro. Antes do tempo, fazendo algazarra. Querendo viver, querendo vibrar. Dai de comer! Dai de comer! Pra depois saciado, deixai a gente esquecer. Deixai a gente morrer. Até o bichinho acordar.

Labirinto- Renê Paulauskas

O sistema é falho. Ou, esmagadoramente nos engole. Antes que pensemos, ele já nos engloba. Num labirinto de portas, que só de cima fazem sentido. É assustador. Não temos muito o que fazer, senão, não fazer com os outros o que não gostaríamos que fizessem com a gente. Tudo vai, tudo volta. Éssa é a lei.

Desconecção- Renê Paulauskas

Sinto correr o risco de me transformar de vítima a algoz numa amizade que perdeu a validade. É como uma droga que quanto mais usamos, menos nos sacia sem perdermos o vício. Assim, dou a mão para o vazio, tentando chegar ao nada. Sabendo do fim, sem esperar mais nada. Apenas o fluxo até a desconecção permanente.

Sistema- Renê Paulauskas

Todos os gênios do mundo, todos os santos, não chegaram nem perto do que é essa coisa chamada vida, mundo, realidade. Nem tudo é falso, mas as coisas não funcionam como parece. Pensamentos geram realidade, essa realidade densa, material. Perceber isso me perturba. Meus remédios me deixam mais equilibrado, mas não me tiram totalmente as percepções da realidade à minha volta. E assim, por um minuto, tudo parece falso. Tudo parece depender de mim. Mas não é. Esse sistema, formado por eles, ou por nós, tem um objetivo além da minha vontade, pensamentos, ideias. Mas tenho muito poucos recursos para perceber o real funcionamente desse sistema.

Paisagem- Renê Paulauskas

Se eu pudesse separar meus olhos do que vejo. Uma paisagem fria. Não existiriam mais dúvidas. Não existiria mais vida.

Seu Zé- Renê Paulauskas

Um Zé ninguém. Mostrando que esse mundo não convem. Fora do mundo tudo tem. Tem tudo e nada porém. Tem sonhos de sobra. Tem a vida toda. Tem o mundo afora.

Trânsito- Renê Paulauskas (1997)

O trânsito está parado, porque as pessoas que correm atrás de seus sonhos vieram parar no lugar errado.

Ressaca- Renê Paulauskas

Dessa vez viajei tão longe, vi sois onde só cabia escuridão. Ressaca de ficar algumas horas fora do ar, de não ter os pés no chão, voar. Hoje fico quietinho, cuidando das dores causadas pelo espírito alegre demais. Cansado.

Voar- Renê Paulauskas

Eu sonho as galáxias. Meu peito tem ligações clandestinas. É preciso morrer. Mas antes, tentar. Voar! Deixar as sinapses eufóricas. Assustar as multidões. Querer ser deus! Querer voar. Sacudir a poeira. Improvisar. Fazer música. Que se nada der certo. Pelo menos compomos bastante.

Tanto- Renê Paulauskas

Tanto que o homem fez, pra gente fazer tão pouco. Tantos homens, mulheres, gênios. Que deram tudo de si a algo. Quantos desses vingaram, floresceram? E tantos outros, gênios, ignorados. Por não serem compreendidos, mas também porque os donos do poder tinham outros interesses, interesses escusos. Quanto vale a obra de um homem? Pra que? A quem pode servir? Seria a pergunta correta. Enquanto gênios pensam a vida melhorar, usam seus cálculos para uma nova guerra.

Pesadelo- Renê Paulauskas

Sonhei que vivia a era Bolsonaro. Não era sonho, era um pesadelo em que não conseguia acordar. Milicias, polícias, baixas patentes do exercícito se achavam no direito de censurar, agredir, e até matar as pessoas. Defendiam a volta da ditadura. Nos quarteis comemoravam o início do golpe de 1964. Garrafas, gritos, tortura. Pessoas desaparecidas. Mães de luto. Gritos, carnaval. A cada instante chegamos mais perto do impossível. A cada instante nos afundamos mais e mais. Como acordar agora onde nos tiram pouco a pouco o sonho e a liberdade? Como acordar se ainda estamos no início do pesadelo?

Menino e defunto- Renê Paulauskas

Entre o menino e o defunto, gosto mais do menino. É mais bonito, viçoso. Mesmo tímido como uma pedra. Ainda dança, sorri. Entre o menino e o defunto, gosto mais do menino, mas me acomodo melhor ao defunto. Que senta pra descansar a perder a hora, o dia. Que é sereno por mais nada esperar da vida, por já ter morrido. Que tem por vida somente esperar. Esperar o menino chegar.

Miragem- Renê Paulauskas

Hoje ele estava rindo. As miragens o divertiam. Poucas preocupações. A vida voltava a ter eixo. Não era como antes. O sacrifício o deixara mais astuto. Mas voltara a viver. As ilusões se desfazendo, mas sempre deixando uma núvem no final, pra se brincar, soltar a imaginação, desejar enfim.

Amigos- Renê Paulauskas

Hoje falei com um amigo que estava brigado. Parece que fizemos as pazes, ou restauramos o respeito e afeto um pelo outro depois de um mês de nossas agressões físicas e morais. Me faz ver como ultrapassamos o limite de qualquer relacionamento. Como somos perigosos um pro outro. E mesmo assim, como ainda existe afeto, apezar das contradições. Decidi seguir sozinho, sabendo que nossa amizade vinha correndo risco, já há varios meses. Mas senti uma inclinação a chama-lo para tocar. Fazermos música mais uma vez. E nos sentirmos vivos.

Toque- Renê Paulauskas

Não toque naquela pessoa, não toque não! Que carrega maltratos na pele, que se a tocar, pode se assustar. Ou mesmo reagir agressivamente para se defender. Aprenda, que essa pessoa você perdeu o direito de tocá-la. Por ínumeros motivos. Seja o de não ter tocado antes, quando tinha permissão. Seja por motivos dela, de se fechar a você. Que você não teve culpa, mas não toque nela! E não tenha ódio, se for possível. Melhor é não pensar nisso. E tocar em outra pessoa.

A casa- Renê Paulauskas

A casa da minha mãe também é minha assim como é de minha avó. Tem um jardim com uma Primavera gigantesca que dá para ver da rua. Meu quarto fica logo após a casa da minha avó. Minha mãe mora na casa do fundo onde fico com ela. Na cozinha papeamos enquanto ela cozinha. A comida mais gostosa do mundo e um dos maiores prazeres do dia, comer. A casa toda é antiga e muito simples. Poucos cômodos com pé direito alto. Na cozinha tem móveis de madeira com história. Uma mesa e uma estante de um grande amigo do meu pai. A sala tem um quadro singelo feito por minha mãe do lado de um móvel fazendo papel de oratório a um santo indiano. No quarto da minha mãe tem duas camas. Numa delas passei parte da infância me curando de gripes e outras enfermidades. Descendo, depois do jardim e a lavanderia, está o meu quarto. Tem uma escrivaninha, onde passava horas desenhando quando era mais novo. Encima dela hoje tem um teclado. Mas fico mesmo tentando tocar o violão, presente de um grande amigo, sentado e

O jardim- Renê Paulauskas

Hoje quando passei pelo lado externo da casa reparei no jardim. Árvores novas crescendo, mesmo sob a gigantesca Primavera que é vista até da rua. O canteiro profundo e cheio de vida após a chuva. E só no final, lembrei de olhar pra rua. Algo está mudando no meu olhar.

Origens do fim- Renê Paulauskas

Quando era jovem vivia a vida, roubava beijos das mulheres mais bonitas, dançava com todas sem me preocupar com nada. Despreocupado, tudo era permitido. Por terminar um relacionamento com uma mulher casada, me culpei, como se fosse o responsável pelo fim de seu casamento. Ledo engano. O fato dela se apaixonar por mim já demonstrava que não sentia mais nada pelo marido a não ser uma forte amizade. Depois disso passei a evitar quaisquer relacionamentos com mulheres comprometidas, e deixei de viver. Mulheres interessantes em fins de relacionamentos acendiam o sinal verde e eu não fazia nada, ou melhor, me esquivava. Tudo resultado desse grande trauma do passado. Hoje vejo meu erro, e espero não errar mais, voltando a viver, sendo que ainda não sou tão velho. Tudo vale a pena se a alma não é pequena.

Escritos da ilha- Renê Paulauskas

Tenho medo de ir pra rua e me perder sem um objetivo, um foco. Como me perdi outras vezes, mesmo conseguindo voltar, com ajuda dos orixás. Adoro caminhar com pessoas que gosto. O foco passa a ser a pessoa, e isso é obvio. Para caminhar sozinho é preciso um motivo, um porquê. Nenhuma pessoa é uma ilha. Tenho excluido o máximo de contatos indesejados para deixar terreno aberto para novos contatos interessantes. O problema é que essa técnica não tem dado muito certo. Volto sempre aos velhos contatos, carcomidos, empoeirados. E o novo sempre demora a aparecer. Ou vem com cara de já velho, ultrapassado. Me podando, ou podando os envolta de mim vou ficando cada vez mais sozinho, isso é fato. Meu problema é a falta de paciência. Ela que rejeita o mesquinho, o desarmônico, o enfadonho, o trivial, o desprazer, enfim, tudo que me desagrada. Então caio solitário nesse mundo imperfeito, cheio de tantos diabos. E me pergunto se tenho coragem de ir pra rua denovo. Depois de tantos tombos. Machuca

Fim- Renê Paulauskas

Sempre que acontecia alguma merda na vida dele ele pensava “e agora?”. Podia ser o fim de um emprego, um relacionamento, uma amizade. Era sempre o fim de algo que lhe dava sustento em algum sentido. E a pergunta “O que por no lugar?”. Acontece que as coisas não funcionavam dessa maneira, antes fossem assim! Pra coisas novas dependia tempo, entrosamento, história. E ficar esperando é o que menos queria nessas horas. Era como uma prisão, uma punição. Normalmente suas rupturas eram agressivas, ou continham agressões. Mais de uma vez terminou machucado, alguma parte do corpo quebrada. Isso na melhor das hipóteses, quando não tinha remorsos de ter machucado alguém que já fora querido em sua vida. Na maioria das vezes apanhava mesmo. Nos últimos tempos estava cada vez mais tolerante e equilibrado. Mesmo assim não tinha sangue de barata. Foi encarar um capoeirista dez anos mais jovem. Errou o primeiro soco e levou cinco golpes na cabeça. Resultado: fim de uma amizade de sete anos. Qua

Loucos, anjos e demônios- Renê Paulauskas

Do alto do meu apartamento me protejo dos animais das ruas. Sim, também sou um animal. Demônios, anjos, somos todos animais. Loucos são aqueles que alcançaram os deuses e ficaram cegos. Deixaram a vida pra alcançar o céu, e ficaram perdidos entre os dois numa eterna procura de sentido. Me impressionam os artistas hábeis, cheios de técnica e entusiasmo. Já eu, sou mais a vida. Suas minucias, miniaturas, minutos. Quisera viver a vida como os artistas vivem a arte, morreria em poucos dias, taquecardia. Assim, não tenho pressa. Saio. Ao cair da noite, fico atento. A tantos loucos no mundo, como anjos e demônios.

Longe das pesquisas de mercado- Renê Paulauskas

Vejo o modo de produção capitalista traçando metas encima de calculos por meio de pesquisas de mercado. Tudo para o fim primeiro e último, seu único fim, dar lucro. Do outro lado vejo a massa ignara consumindo sem nenhum critério. Sendo levada como bois para um lado e pro outro. Tudo atendendo as necessidades primárias. O nível básico para alcançar o maior público. Penso nesse modo de produção e algo me diz que existe ferrugem nas engrenagens desse sistema. Que parte da humanidade sempre será manipulada pelas super estruturas e meios de produção. Mas existe uma parcela mais consciente, tanto para viver, como para consumir. E é, em algum lugar desse pequeno mercado consciente, que pretendo estar. Ganhando o suficiente para um consumo inteligente, básico. Produzindo minha arte com liberdade. Bem longe das pesquisas de mercado.

Artistas marginais- Renê Paulauskas

Já não olham os meus desenhos. Não tenho mais leitores para meus textos. Nunca tive ouvintes para minhas canções. Se antes era um desenhista marginal, começo a duvidar que ainda seja um artista. Existem artistas sem público? Que tipo seriam? Presos em sua carne, isolados. Ausentes de opinar sobre seu tempo, ou fazendo de modo invisível. Esperando um dia serem descobertos. Sim, são assim muitos artistas. Mendigos viciados em próprio ego. Encharcados de verdades e certezas. Querendo se impor ao mundo. Frageis, solitários, incompreendidos. Fazem o que sabem melhor, falar de si. Desenham, escrevem, fazem canções. Não como um lazer, um hobby. Fazem como um vício. Incorrigiveis artistas marginais. Morrem pobres, as vezes mendigos. São, na maioria, incapazes de se adaptarem a outros trabalhos. Se sujeitam a tudo, desde que não retirem suas certezas, dúvidas, e inquietações. São pensadores presos a um outro mundo.

Kafkaniano-Renê Paulauskas

Eu que não me engendro nesse mundo kafkaniano cheio de instituições. Preferiria um mundo anarquista, feito de pessoas conscientes para um mundo melhor. Em vez disso, retalhos de gente. Fragmentadas por regras. Que nem elas entendem ou sabem de onde vem. Quebra-cabeça irregular, cheio de falhas e peças. Mundo kafkiniano onde seguem-se ordens sem questionar.

Vida- Renê Paulauskas

Muito se imagina sobre nossa função nesse planeta. Visões religiosas, científicas, morais, matemáticas tem cada uma seu limite, nunca chegando a um concenso. Não se sabe de onde a vida veio para esse planeta. Cientistas concordam que não é própria desse planeta, que teria vido de outras estrelas. Mas como, ainda nāo chegaram num concenso, sendo que, se trazida por meteoros seria a base para criação da vida prejudicada. Teria que ter sido trazida em segurança. E isso, só se fosse por vida inteligente. A vida criada nesse planeta tem características muito próprias. A lei da sobrevivencia a todo custo parece ser o motor em todas as espécies. Quando chegamos a qualquer ecosistema, achamos uma espécie matando a outra para sobreviver, desde o menor até o maior predador. Somos o maior predador do planeta, e temos uma característica que nos diferencia. Criamos máquinas para nos auxiliar no duro trabalho da sobrevivência. Seria a vida na terra trazida com o mesmo propósito? Ou sobreviver a

Talentos e seus oficios- Renê Paulauskas

No ano 2000, tinha 21 anos, estava desempregado a um ano. Meu último emprego tinha sido como assistente de um cartunista de que era fã. Tinha passado mais tempo desenhando, dentro ou fora da escola de desenho. E pensava, ainda quando era assistente, em desenhar as pessoas na rua. Certo dia, peguei um bloco de folhas e fui oferecer de fazer caricaturas nos bares próximo da casa do meu pai, onde estava morando. Em pouco tempo estava ganhando mais do que como meu antigo emprego. Depois fui convidado a fazer eventos, onde cobrava por hora. Em 2008 cobrava três vezes o valor por hora do que cobrava em 2000. Tinha feito uma turne fazendo caricaturas no Brasil inteiro, viajando de avião, ficando nos melhores hoteis, mesmo não ligando para essas coisas. Daí veio a crise mundial, acabando com todos investimentos e gastos com entretenimento e cultura. Desde então o trabalho de eventos praticamente acabou no Brasil. Trabalhos que fazia em menor escala, como ilustração pra livros, também pior

Escapando da morte- Renê Paulauskas

Começo a vislumbrar a possibilidade de voltar a ser normal. E o que é ser normal, se não, um estado de plena desilusão com tudo. Uma desesperança misturada a sentença de estar a todo tempo chegando cada vez mais próximo da morte. Pensando bem, escapar da morte, já pode ser uma esperança. Que seja!

Vida ordinária- Renê Paulauskas

Vidas ordinárias, em ordem, ordinárias. Sim, nossa sina é viver. Com meia ou uma dúzia de afazeres. Pouco ou nada entendendo. Pouco ou nada. Sina. Sem poder alçar voos. Pés prezos no chão. Vida. Vida ordinária. Em ordem com o caos.

"Parceria" (micro-conto) - Renê Paulauskas

Ele nem percebia que quando falava para seu amigo parar de cantar, que aquilo era uma violência. Não se dera conta que sua amizade foi construída graças a esse prazer, o de fazer música. Seu amigo ouviu decepcionado a primeira vez ele dizer das primeiras composições juntos: "Mais ou menos" com um despreso incutido. Se separaram por um tempo. O de voz ruim voltou a compor sozinho, mesmo sem voz e tocando violão muito mal. Ele, tirava músicas populares no violão, pouco tinha de compositor. Quando se reencontraram para tocar, seu amigo deixou ele tocar e cantar sozinho. Começou empolgado. Foi desidratando. Quando chegou no final estava já sem ânimo algum. Soltou um "é chato cantar sozinho" e foram caminhar em silêncio.

Minha voz- Renê Paulauskas

Não tenho voz. Isso me mata por dentro. Quando faço uma música, gosto do que eu ouço, me leva pra vários lugares. Mas depois de gravada, quando ouço no dia seguinte, parece outra música, muito pior. Não gosto da minha voz gravada. É anasalada, abafada, dissonante. Gostaria que fosse limpa, afinada. Mesmo assim, continuo insistindo. Tendo melhorias à passos de uma lesma. Fazer o que, adoro fazer músicas.

Limbo- Renê Paulauskas

Por já querer e mudar a ordem das coisas, estou no limbo a bastante tempo. Para que eu não cause desordem novamente. Mantenha a sala, suas estátuas, sua ordem intáctas. Saber demais as vezes da nisso. Mas não acredito que seria melhor caso fosse um ignorante. Estou a margem, mas estou vivo.

Vida e arte- Renê Paulauskas

A vida é sempre mais complexa do que a arte. É a matriz de onde emergem todas as visões de mundo. É o mundo e é além. Algo, sinceramente, impossível de ser pronunciado. Porque é tudo e uma em cada uma vida. É o inesgotável. A chama. A inspiração. Mas tudo isso não é a vida, é minha vida.

Mulheres- Renê Paulauskas

Mulheres, com seus olhares, sorrisos, nos tiram do caminho, do chão. E seguimos elas por onde vão. Até nos abandonarem. E quando nos damos conta nem sabemos onde estamos, como viemos. Só queremos voltar pra casa, em meio a escuridão.

A raiz do problema-Renê Paulauskas

As coisas a minha volta funcionam como ecos de meus pensamentos. Não sei se sou parte principal ou periférica desse sistema. Se penso, logo existo, não há dúvidas que tenho participação efetiva em tudo que ocorre. Mas, ao mesmo tempo, parece mais uma conexão como uma interconexão via rádio. Como se usasse minhas palavras pra dizer o que quer. Sim, já interferi no direcionamento da realidade algumas vezes. Mas isso não acontece o tempo todo. Caso contrário teria certeza que nada haveria além de meus impulsos e desejos. Acredito ser uma especie de sistema programado em um nível de realidade que somos incapazes de alcançar. Onde temos parcela dentro deste sistema como um programa específico para fins específicos. Descobrir nosso propósito nesse sistema, ou para o sistema, parece algo inalcansável. Nos limitamos aos impulsos e desejos internos aos quais estamos encerrados.

Invisibilidade- Renê Paulauskas

Até acredito que é impossível ir contra o sistema. Mas acredito também que essa é uma das minhas funções. Minha mãe conta que antes de eu pronuciar as palavras: papai e mamãe, disse: não. Sempre fui do contra. Encontrava, enquanto jovem, a antítese como ferramenta da dialética, mesmo se não chegasse a um consenso. Hoje sou bem mais tranquilo. E isso se deve ao fato de tomar remédios que controlam minha impulsividade natural. Mas estou bem. Continuo lutando contra os sistemas, político, social, e até, metafísico ou invisível deste mundo. Acredito que muito do meu esforço, ao contrario do que gostaria, gera mais invisibilidade e descrédito do que gostaria. Mas tenho que continuar sendo fiel, antes a mim, do que aos outros.

Cão- Renê Paulauskas

Um Deus impotente, do avesso como um cão. Esse sou eu. Aquele que deseja e pouco tem. Mesmo assim se conforma. Ser pensante que vê parte de suas frazes em termos contrários. Difíceis tempos. Difícil vida. Seria mais fácil ser um cão.
Textos são reflexões, estão longe de serem verdades. Digo isso me referindo a textos como "Amizades" e não a textos políticos.

Brasil 2019- Renê Paulauskas

O PT, partido dos trabalhadores, sempre foi o partido mais democrático brasileiro. Nunca acreditou no comunismo. Todas as conquistas foram lentas respeitando a constituição e o congresso. Não a toa, foi no governo do PT que graças a sua postura democrática, se iniciaram o Mensalão e a Lava-Jato. Graças a postura democrática da Dilma, contra a sensura das massas manipuladas pela Rede Globo e parte do congresso golpista, foi tirada do poder sem nenhuma prova de crime de responsabilidade que seria em seguida absolvida. Por acreditar nas mesmas instituições democráticas, o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi preso, ainda com seu processo em trânsito, por um crime sem provas. Hoje vivemos o momento mais antidemocrático após a democratização depois da ditadura de 1964 carecterizado por uma esquizofrenia em que se culpa o PT fazendo críticas fantaziosas de serem um partido extremista comunista, quando é justamente o contrário. Essa fantasia leva junto uma estratégia de poder e mark
Os textos menos lidos geralmente são os que mais tem a dizer.

Realidade?- Renê Paulauskas

A realidade infelizmente não é o que parece. Ela tem dois modos distintos de funcionamento. O primeiro, através das aparências de um mundo real e além de nossa existência. O segundo é o qual mergulho, impossível de se provar, mas tenho plena convicção e experiências. É um mundo onde não existe diferença entre o que pensamos e sentimos e o que acontece. Somos interligados em tudo o tempo todo sem percebermos. Gerando e alimentando realidade. Cada palavra pensada, que ecoa na televisão ligada, à um pensamento mais complexo, refletindo em acontecimentos, tudo relacionado aos impulsos de nosso cérebro. Infelizmente essa é uma verdade que só se acredita experimentando. Ou depois de se ter algumas experiências. Mesmo assim, na maior parte do tempo, vivemos alienados acreditando que um mundo real realmente existe.

Amizades- Renê Paulauskas

Sinto meu crânio latejar das primeiras dores de cabeça de uma amizade que parece chegar no seu fim. Foram sete anos desde que começamos a nos relacionar. Sete anos é um bom tempo para uma amizade, depois disso coisas desagradaveis começam a aparecer, isso quando não é o proprio desinteresse de ter conhecido o outro e esse não trazer mais novidades. Amigos ajudam a moldar nossa personalidade. O mais cruel é saber que tudo começa, se desenvolve, e termina. Com as namoradas é ainda mais rápido, mas com os amigos isso também acontece. Amizades se fazem ao longo dos anos. Há pessoas que nos conectamos de imediato por varios motivos, afinidades. Mas só o tempo faz o interesse aliado ao conhecimento do outro brotar algo que os una em uma cumplicidade.