Loucura.doc- Renê Paulauskas

 Hoje fui tomar banho, e fazendo a barba, nem me cortei. Limpei a espuma do sabão e vi o resquício de uma cicatriz antiga no pescoço, coisas de juventude em tempos difíceis, onde a mente estava dominada por seres sem íris, um verdadeiro inferno na Terra. 

Hoje estou pleno, porque posso falar sobre a loucura, sem estar louco. E isso reforça minha arte, como se fosse um caminho seguido, sentido, e hoje entendido, o suficiente para escrever sobre ele.

Muito antes de surtar, quando criança, a loucura já captava minha atenção. Lembro de com uns sete anos ver uma exposição completa das obras de Arthur Bispo do Rosário, nada antes me tocara daquela maneira. Suas obras como reinvenção do mundo a partir de seus surtos, só mais tarde fui entender, mas a imponência de sua obra, me deixou embasbacado.

Adolescente conheci os vídeos do Leon Hirzsman, Imagens do Inconsciente, sobre o tratamento através da pintura dos pacientes psiquiátricos da Nise da Silveira. Nesses vídeos mostrava como o tratamento através da arte, mais os relacionamentos entre os pacientes, e até com os bichos, melhorava a vida, numa espécie de terapia. Mostrava também, como certos mitos estavam presentes nas pinturas, e seu desenvolvimento através do tratamento.

Quando entrei na faculdade de Sociologia, queria tratar desses temas. Mas, no final do terceiro ano, tive um surto e fui diagnosticado como tendo Transtorno Bipolar, mesma doença da minha avó. E achei mais importante fazer meu trabalho de conclusão de curso sobre loucura e manicômios.

Saindo da faculdade reencontrei um amigo de juventude, agora com esquizofrenia, pouco depois viemos a fundar o Coletivo Calangos em 2012, onde passei a escrever junto com ele sobre assuntos ligados ao tema em forma de poemas, crônicas, contos e outras artes como ilustração, HQ, animação e músicas.

Em 2015 escrevi a peça Breve Passeio Pelo Bosque da Loucura, uma verdadeira catarse sobre minha experiência pessoal com a loucura escrita em dois dias. Essa peça teve uma leitura dramática pelos pacientes do CAPS ligados ao Ponto de Economia Solidária do Butantã em 2016.

Continuo produzindo textos ligados, direta ou indiretamente, ao tema.

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