Tempo acabando- Renê Paulauskas
Sinto que meu tempo está acabando há muito tempo. Agora é o
fato de estar sozinho, sem trabalho e saber que o dinheiro vai acabar. Sentia-me
desmotivado para qualquer novo tipo de trabalho, até perceber que este: o de
escrever minhas histórias, minhas loucuras, é o que faz mais sentido para mim.
Cheguei ao ponto de achar que nada existe, porém existo, e
isto é dado pelo motivo de eu pensar. Que as coisas não são o que parecem, mas
não quero expor minhas loucuras o tempo inteiro para não ser descreditado.
Loucuras que na hora fazem todo sentido, mas que se passado uns dias são loucas
e ridículas inclusive para mim.
Mesmo assim acho importante narrar essas histórias que
ocorrem na minha cabeça, apesar de só estarem em parte no conteúdo deste livro,
se é que de fato se torne um.
Estou sozinho, já não me acho tão bonito, mesmo olhando no
espelho o mesmo homem de sempre. Sinceramente não entendo porque ultimamente as
mulheres pararam de me olhar. Estou com trinta e seis anos, alguns cabelos
brancos e acho ou achava que a vida acaba aos trinta.
Minha filha não quis sair comigo este ano nenhuma vez se
quer. Ela fez quatorze anos e acho que isso é fruto de sua conquistada
adolescência. Conversamos às vezes por telefone, mesmo ela não retornando
minhas chamadas.
Tenho tempo para fazer o que quiser, e não faço quase nada.
Desacredito ou não tenho grandes ilusões sobre o mundo. A não ser no potencial
da minha loucura, que logo passa após uma noite de sono.
II
Nestas últimas semanas minha irmã tem morado de novo com a
gente e minha sobrinha passa sempre alguns dias da semana aqui. É uma pestinha,
mas gosto cada vez mais dela. Outro dia após ela pegar a Nina, nossa gata, pelo
pescoço após nós falarmos pela decima vez para ela não fazer isso a levantei
pelo pescoço alguns milímetros do chão. Não passaram vinte e quatro horas ela
estava lá pegando a nina de novo.
Quando minha irmã voltou um dia desses para casa, suas malas
estavam todas do lado de fora e o porteiro do prédio a avisou que não podia
mais entrar. Veio aqui pra casa até conseguir alugar uma própria. Parecia que
eu via o que causei a minha ex-mulher por outro ponto de vista, o da mulher.
Desde então é um estresse quase diário que minha irmã e nós sofremos juntos.
Vejo a insegurança da minha irmã em não querer denuncia-lo e
penso na insegurança que não passou a mãe da minha filha comigo. Em não querer
os bens que ganhamos no casamento, só pedindo sua pequena televisão. Quanto
tempo para ela me olhar de novo para termos uma conversa comum novamente: Dez
anos. Dez anos em que passei vivendo entre o mundo e minha loucura.
III
A ansiedade ainda me tormenta, mesmo quando já tenho aonde
ir. Fico dando pequenas voltas pela sala, impossível ficar parado. Então venho
até o computador e começo a escrever. Penso se não são comuns demais minhas
histórias, se não sou banal ou ultrapassado, se teria serventia para alguém
saber que todos os comuns e medíocres são tão loucos como eu.
Não vejo a hora de terminar esta ultima parte do que pensei
poder ser um livro e juntar todas as outras partes, que se pretendiam e não viraram
livros, um Frankenstein. Aviso a todos que não estudei para ser escritor. Bem,
isso deve estar óbvio pelo modo direto e pouco refinado de meu texto.
Se me perguntassem se gostaria que isso aqui virasse um
Best-seller, claro que diria que sim. Mas se me perguntassem se eu acho isso
boa literatura, certamente diria que não. Por isso penso que se tem algum valor
nessa coletânea de autodescrições, é simplesmente pelo fato da vida ser maior
do que a obra e fazer sua própria pintura enquanto aprendemos a rabiscar.
IV
Não acredito neste mundo, em suas teses, sejam físicas ou
filosóficas. Acredito mesmo numa coordenada engrenagem não vista desta
dimensão. Inalcançável, pensei ontem, só ser possível entende-la pelo
significado: infinito. Assim as coisas não existiriam por si, mas estariam
presas, como desenhos de uma colcha movimentada por algo que não se vê. Só
podendo se descolar da colcha mirando o infinito, uma nova dimensão.
De outro modo, as coisas seriam representações através de
nossas sinapses ou ideias. Podendo existir coisas muito além das aparências ou
sermos manipulados facilmente por ideias que não seriam propriamente nossas.
Os que ficam assustados são sempre os mais medíocres que se
negam a pensar, agindo por inercia ou nada questionando, criando o grosso da
massa para sustentar o domínio dessa amálgama.
De todo somos controlados por forças que vão além de nossa
razão, sejam forças exteriores ou nossa própria ignorância. E é muito difícil
aceitar isso sem tentar sair deste controle que é imponderável.
V
Imponderável é a vida, essa nossa busca em tentar agarrar o
invisível. Mesmo assim estamos vivos, temos que nos agarrar em algo, concreto.
Essa parte está parecendo livro de autoajuda. Uma vez conversei com uma modelo
que pousava nu artístico na escola de desenho em que estudei e ela disse: “eu
consigo tudo o que eu quero, todas as coisas acontecem pra mim” Não sei por que
sempre a imagino num terrível acidente de carro.
Não acredito em uma fórmula ou modo certo de levar a vida,
muito pelo contrário. Vejo no geral pessoas tão diferentes em personalidade e
filosofia de vida, terem no geral as mesmas condições: Uma família, poucos
amigos e uma vida social capenga. O que acontece é que sempre imaginamos que o
outro é mais afortunado que nós próprios. Somos, acredito, nesse aspecto, muito
parecidos.
E é dessa vida que
tento fugir. Os limites da vida. Limites esses que se afunilam mais a cada ano.
Parecendo um cerco se fechando. Não me dando saídas. Por isso só a loucura é um
lugar onde ainda existo por inteiro.
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