Chipanzés (micro-conto) - Renê Paulauskas

Vivia entre aqueles que pouco lhe davam e aqueles que escolhia por perceber neles frutos ainda não experimentados. Pouco saia, vivia mais em casa, adorava televisão. Trabalhava pouco, muito pouco mais recentemente. Gostava de viajar, mesmo que fosse dentro da própria cidade. Conhecer pessoas novas, novas conversas, era um festeiro. Envelhecia a cada ano, se achando cada vez mais sem sorte com saudade da juventude. Antes um otimista, agora na meia idade, inclinava-se a um realismo baseado na descoberta recente do maligno aspecto da espécie humana de um modo geral. Pensava, às vezes demais. Meditava, também. Via beleza nos pássaros que frequentavam seu pequeno jardim, nos frutos doces de suas árvores, nas crianças de modo geral... 

Se sentia mais fraco que o mundo, mas se fortalecia escrevendo e compondo músicas. Era evidente que este mundo estivera sempre do lado errado. Do lado da força, do poder, do dinheiro, da ganância. Mas o que deixava seus pesadelos mais vivos, era a percepção que tudo isso vinha da nossa espécie, e até de nossa herança mais animal. Observava os chipanzés e sua cabal personalidade curiosa e agressiva. Nossos primos, de fato! 

Sozinho no mundo produzia versos. Se sentia numa ilha, esperando notícias do continente. Era mais espectador daquelas ''garrafas de mensagens'' do mundo que um mensageiro de alguma coisa útil pra maioria. Mas queria mudar o mundo, por isso escrevia versos.

Comentários

  1. Bonito seu texto, reflexivo e bem escrito, me vejo um pouco nele, ainda que me falte o dom do verso. Parabéns

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