Os deuses brincam- Renê Paulauskas
Os deuses brincam com meus sentimentos e eu brinco como os
sentimentos dos humanos. Querem me matar agora que também sofro como vocês. Um
deus caído, mas ainda possuo um olhar.
Outro dia, dentro de um ônibus, quando estava pensativo,
olhei num passageiro meu olhar. Não sei porque se por medo de me ver ou medo de
me frustrar desviei o rosto. Pouco depois o vi no reflexo do vidro da janela o
pobre homem de olhar vivo como de um desenho animado, que desceu do ônibus e
relaxei.
É triste o que fazem com a gente, manipulam tudo e nos resta
pouco, talvez somente o projeto, alterado e carcomido, como um esboço sem
sentido. E nos resta fôlego e nos falta ar, fazemos o mais cabível, deixamos as
falas, os sonhos, os desejos que não se encaixam. E esta etapa é somente uma
nova tecla a encontrar um novo patamar. Como uma escada rolante que desce e
tentamos subir, nos esmagando os pés, as mãos, os olhos até definharmos tanto e
sermos somente fantoches que de cima ditam regras, mortos como são os deuses.
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