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Sonhe!- Renê Paulauskas

Muito se crítica os sonhos de cada um. O que não se fala é que nesse mundo capitalista só tem chance de sonhar quem é privilegiado. O pobre tem que trabalhar a vida toda, na maioria das vezes sem descanso, se acostumando com a dura realidade esmagadora, que é sobreviver a todo custo. Para sonhar é preciso ter uma vida, uma perspectiva. Mas contra tudo e contra todos ainda existem aqueles que sonham, mesmo contra as intempéries. São eles juntos que nos dão alento para seguir em frente. Salve os sonhadores desse mundo! Só sonhando é possível haver transformação.

Vida II- Renê Paulauskas

Estar vivo com todas as funções em dia é superior a mais eloquente poesia. Estar saudável e espirituoso é o maior bem da vida. Dela se retira todo o estímulo para a arte. Através dela se multiplica a vida, que corre como um rio traçando novos caminhos através do solo que encontra. Esse precioso bem: a vida, há de sempre existir. Não importa as intempéries, riscos e perigos. Há de se adaptar, se não por ela mesma, através da tecnologia.

Redes sociais - Renê Paulauskas

 Hoje a régua me derrubou. Ela que mede tudo. Veio até mim e disse: "está abaixo da medida". E me encolhi em minha insignificância definida. Vendo como ainda podia respirar mesmo assim. Em como as réguas nos regulam no dia a dia. Em como tentamos nos destacar.  As réguas só servem pra medir a média, o medíocre. Para coisas criativas ela não tem valor. É preciso força para ir contra as regras. Mas vale.  Não quero ser régua pra ninguém. Quero ser aceito, curtido. Como somos reféns desses novos tempos de redes sociais. Como isso nos faz mal. Como deixamos de viver.

Pés descalços- Renê Paulauskas

 Sonhei que estava andando e percebi que estava descalço. Em seguida achei meu tênis, mas com um tom diferente. Uma moça saiu atrás de mim dizendo "pega ladrão!". E eu corri, pois não tinha outro tênis para usar. Fico pensando quanto esse sonho não é a realidade de tantas pessoas. Que roubam comida por estarem famintas e são encarceradas sem direito a defesa num julgamento justo. Victor Hugo escreveu "Os Miseráveis" exatamente com essa entonação. Mas aqui no Brasil o problema é ainda maior. Desde a escravidão os negros no Brasil não tem direitos civis como os brancos. Isso é um horror que carregamos em pleno século XXI.

Anjos tortos- Renê Paulauskas

 O mundo não acordou com meu grito. Só fiquei mais rouco e impotente. Meus versos tronchos não foram abençoados. Meu alaúde foi quebrado. E segui um anjo torto. Sem lugar, um tanto castigado. Na berlinda, no meio de tantos outros anjos desgraçados. Putas velhas, moradores de rua, artistas sem grana, marginais de toda parte. Nossa música não é ouvida. Sim, confundida com o barulho da avenida, dos carros, buzinas, transeuntes de toda parte. Da onde pisam apressados os bem afortunados e dalí saem cansados. Esquecidos, ignorados ou maltratados, já não cantamos, só vivemos sem sermos escutados.

Arte- Renê Paulauskas

 Na maior parte das coisas a nossa volta há arte. Os designers dos produtos que consumimos. A arquitetura, por mais simples que seja, das casas, edifícios etc. Os roteiros super bem escritos por trás de filmes, séries e novelas. Sem contar a grande arte dos artistas estabelecidos que nos circundam. E os artistas marginais? Tem este nome justamente por não estarem nem no ramo como meros operários, nem conseguiram um lugar ao sol. São anônimos que vez ou outra conseguem algum lugar que os dê algum destaque. É a maior parte dos artistas. É o lugar por onde todo grande artista já passou. E o lugar onde a maioria vive sem nunca ser descoberto. Os caminhos existem, mas nem sempre são dados para esses eternos sonhadores. Às vezes falta-lhes algo. Uma direção, um apontamento de um artista mais experiente, algo que lhe renda trabalhar e ser conhecido. Caso contrário, o simples cansaço do dia a dia, enterra suas forças na miséria de uma vida triste e desvalorizada.

Folha de papel - Renê Paulauskas

Engrenagens corroídas em meu sangue. Faço tudo da melhor maneira possível. Mas a ave desgovernada no meu cérebro voa cada vez mais alto. Já não sinto medo, não tanto. A folha rasga na minha frente de modo tão claro e definitivo que sinto meu corpo relaxar. Não haverá novos tempos, novas horas. Seremos poupados de tudo. Todo sofrimento, físico, psíquico, social, político. Não seremos livres. Simplesmente não existiremos. Não existe vida sem sofrimento. Essa vida na Terra é um eterno sentir fome, matar pra comer, ter desejos e perpetuar a espécie. Esse ciclo se perpetuou por milhões de anos. Até que interferimos inconsequentemente e desequilibramos o clima, pondo assim uma pedra na evolução e no mundo como conhecemos. Só nos resta aceitar. Como uma folha de papel caindo no asfalto. Sentir o brilho do sol cada vez maior. E a beleza das paisagens que dão lugar à desastres naturais. Perceber a beleza da vida na Terra, mesmo com fome, guerras, doenças e miséria. Ver tudo o que o ser humano c...

Sonho- Renê Paulauskas

Quando criança perguntei para o meu pai, em frente ao mar, se a vida era um sonho. Hoje tenho certeza que sim. Segundo os cientistas de hoje, a vida na Terra, animal, vegetal, no solo e nos mares, não deve passar de 2100.  Já me perguntei: Qual a probabilidade de ter existido vida na Terra. Ou de ser um ser humano em meio de tantas espécies. E agora, depois de milhões de anos de vida nesse planeta, a vida acabar justo na minha geração. A resposta é simples: Não nos contaram a verdade. Mas sigamos, essa distopia fajuta, que mais parece um pesadelo.

Pontos de luz - Renê Paulauskas

 Passei metade da vida olhando aquele pequeno ponto de luz, às vezes azul, outras amarela, raramente branca. Imaginava, quando surgia o brilho, ser fotografado por ela, compondo ao longo dos anos uma espécie de cronologia dessa minha vida. Por crer assim, também tenho na vida, minha mais fiel busca e saída. Como se viver fosse espontaneamente a arte mais completa das artes, a minha história de vida. Que não pode ser vista por grandes feitos, grandes obras. Mas nos olhos de cada qual encontrei e entrei pela sua memória. E pelos pontos de luz.

Anônimo (poema) - Renê Paulauskas

Não vim pra esse mundo Fazer sucesso Mudar o mundo Nem muito dinheiro  Vim pra cá Descansar No meio da catástrofe da vida Pra quando eu voltar Ter sabido como é ser assim Um mundo de sonhos  Anônimo 

Pés brancos (poema)- Renê Paulauskas

Morte Só vejo a morte chegando Subindo a serra Com seus pés brancos descalços Quem dera já estivesse aqui Poderia partir E recomeçar  Mas sinto sua presença  Ainda longe Mas presente Um ponto certo a me entregar Mas não hoje Por enquanto  Procuro vida embaixo das pedras Atrás dos móveis  E me escondo  Num espelho maldito  Que tudo sabe Sem nada dizer.

Tédio (poema)- Renê Paulauskas

Óh, hora maldita! Hora que não passa! Tua engrenagem de segundos está travada Dessa locomotiva vã que é o mundo sem paisagens Quero engolir tudo ao meu redor Todos os sinos Todos os sois e luas E caminhos ainda novos Mas quando chego cansado No dia seguinte Lá estou eu à engrenagem engasgar.

Matriz (poema)- Renê Paulauskas

Os gênios Os medíocres Os vassalos Os revoltosos Todos eles bons Todos eles ruins Quisera o mundo  Não fosse a matriz De todas as almas Encarnadas Quisesse um dia só  De puro brilho de liberdade Não seria o jegue levando no lombo Não seria o negro falado e mal visto  Seria um mundo novo Mas é mesmo falso este mundo O que nos impõe  É tamanho De crueldade  E vileza  Tamanha a natureza  De tal desplante  Rompendo a pureza Olhos da carne Gritando por nós Mas o bicho homem Sem nenhuma voz.

Mental na Política - Renê Paulauskas

 Falo hoje de como a esfera mental influência na tomada de decisões, e ao mesmo tempo, como somos bombardeados de coisas que influenciam nosso mental. Falando de política, através do mental, são definidas ações que impactam outras pessoas, definindo assim uma política através do mental que pode ser iniciado por um processo de estímulos, idéias, desejos... O processo pode ocorrer de fora pra dentro também. Quando somos bombardeados de informações afim de exercermos uma resposta. Isso vem ocorrendo na política por modo de veiculação de informações falsas afim de disparar ações esperadas após serem absorvidas por pessoas sem preparo para refutalas. Enquanto não tivermos pleno conhecimento desse mecanismo, nada poderemos fazer para nos proteger desse tipo de abuso. A política hoje está imersa nesse campo mental. Essa é a nova Hera da política dos tempos atuais.

Resumo de uma história - Renê Paulauskas

 O que é isso, essa história de vida terrena sem grandes aventuras ou desastres que valha a pena ser contada? Ainda pequeno tive a sensação de ser de outro mundo, mesmo não sabendo de qual. Me escondia na imaginação fértil me distraindo comigo mesmo. Inventava lugares, criava histórias. Difícil era me prender nas coisas reais.  Na escola, estudar, não estudava. Passava de ano em recuperação, com o caderno cheio de desenhos no lugar das matérias. Mas quando tinha que fazer um desenho para um cartaz, sempre tirava dez. Mesmo na escola de desenho que meu pai me colocou, nunca fui muito disciplinado. Mas foi lá que me destaquei. Na adolescência fui fazer teatro. Mas mais ficava operando o som do que atuando, além de desenhar o cartaz da peça. Quando finalmente me apresentei como ator, vi que não era o que queria, e voltei para a escola de desenho. De lá virei assistente de um cartunista de que era fã. Foi rápido, pouco mais de um ano. Mas aprendi o essencial para me tornar um prof...

Amém - Renê Paulauskas

 Hoje eu relaxei, me juntei aos idiotas e disse amém. Amém pra sociedade injusta que pune pela cor da pele e absolve pelo montante em dinheiro. Amém para o capitalismo que enterrou nosso futuro sem volta depois de impactar o meio ambiente. Amém pra aqueles que tem fome, que não tem esgoto nem acesso a água. Amém pro pastor corrupto. Especializado em tirar o dinheiro dos ignorantes e fazer suas cabeças. Amém aos padres pedófilos. Tirando a inocência de uma vida. Desgraçando do fim ao começo. E amém aos idiotas como eu, que acreditam no direito à alienação deixando o mundo como está.

A Pedra e a Criança (Poema) - Renê Paulauskas

 A palavra Já não dizia Calada Rocha fria Entre os gatos  Esperando sentado Atento e relaxado O próximo ato Sem saber a vida Sem nem dar por sorte O destino ia se fazendo E o tempo tecendo a morte Mas quando distraía Era a pura vida tinindo Nem sabia do que ria Como criança sorrindo.

Artistas- Renê Paulauskas

 O mundo é um lugar talhado pela exploração e subserviência em todos os sentidos. Existem os capitalistas (poucos) e um mundo inteiro de explorados (trabalhadores). Enquanto a imensa maioria gasta energia em como se adequar para ser absorvido em sua mão de obra pelas indústrias e empresas. Do outro lado, existem as pessoas que se especializam em um método próprio, que também será absorvido futuramente pelos capitalistas, se tiver êxito. Assim nasce o trabalho de vários artistas, obcecados em criar. Pessoas que tem, ou inventam, tempo livre para serem elas mesmas (um mundaréu de coisas) que elas pensam, sentem ou refletem em suas breves histórias de vida. Esse perfil de gente, tem um quê de inconformado com seu exterior. E se conseguirem ficar firmes em suas convicções, não desistindo, ou se entregando à exploração, o supérfluo e enganoso, se tiver êxito, conseguirá mudar o mundo. Até as engrenagens do sistema aproveitarem a novidade afim de lucrar com a novidade.

Silêncio - Renê Paulauskas

Ouvir alguém requer silêncio. Silêncio para digerir as palavras. Silêncio para refletir, só depois falar. Poucas pessoas fazem isso. Por isso o mundo é um lugar, quase sempre, sem fala, e muito barulhento.

Senso comum - Renê Paulauskas

 O senso comum é mediano e implacável. Mediano, porque nunca é o aprofundado, sempre o mais imediato. Implacável, pois todos, usamos sem perceber ideias de senso comum, nem que seja para aprofundar uma questão ou outra. O senso comum está em todos nós. Numa ideia pré concebida, numa primeira impressão, e assim vai. Talvez tenha algo de primitivo, algo intuitivo. De todo modo, somos reféns dele. E talvez, entendendo seu poder, possamos ser menos oprimidos por pessoas sujeitas ao senso comum sem se darem conta.

Caminho das letras- Renê Paulauskas

 Caminho de pedras tem sido o desenvolvimento da minha nova arte. Não a do desenho, que teve início com os primeiros passos por meu pai, depois a escola de desenho e por último ter sido assistente de um grande cartunista. Já a nova arte, das letras e da composição, tem sido feita quase sem apoio, sem escola, sem mestres.  Não sei bem porque, mas tem sido mais difícil achar um caminho nessa nova arte. Tem sido muito solitário. Talvez só me caiba o assento de um amador nessa função de escritor e compositor.  Por enquanto luto. Pouco a pouco, sem gastar toda energia duma vez. Me exercitando. Mesmo sem mestres, escolas e colegas. Um caminho solitário, mas não sem inspiração.

Ideias em si- Renê Paulauskas

 Cada coisa traz pelo menos uma ideia em si. Por exemplo, uma criança traz a ideia de esperança por ter ainda muito tempo de vida pela frente. Existem também as ideias do inconsciente, as dos arquétipos e símbolos de nossa mente. E ainda a razão de como as coisas funcionam no seu ordenamento material, físico e prático. A loucura pode ser entendida como um encharcamento de ideias relacionadas a símbolos interiores, mais ideias egocêntricas e paranoides sem a estrutura racional que ordena o funcionamento das coisas. Dessa maneira é capaz de se fazer várias viagens ao interior psíquico e ter descobertas incríveis.  O problema, após essas experiências, e ter voltado para o mundo racional, é não conseguir encaixar mais as "viagens" no seu mundo regido por uma lógica mais materialista. Assim fica-se dividido entre dois mundos. O dos símbolos e da materialidade das coisas. Até conseguir encaixar, ou não, cada coisa em seu lugar.

Caixas- Renê Paulauskas

 Num planeta uma coisa chamada vida se desenvolveu por um sistema de reprodução e alimentação onde uns comiam os outros. Bilhões de anos após essa cadeia ter iniciado, uma forma de vida se destacou. Viviam agrupados aos milhões em pequenas caixas donde saiam para serem agrupados em tarefas ditas por outros em troca de crédito para comida, roupas e pagar os recursos das caixas de moradia. Esses seres tinham criações de outros seres só para se alimentarem. Assim como criavam uma enorme quantidade de produtos para gastarem com seus créditos. Quase não saiam de suas caixas fora dos dias em que faziam tarefas para os de caixas maiores, que também faziam tarefas para outros que viviam em caixas ainda maiores e que viviam de caixas gigantescas de onde vinham e eram fabricados os créditos. Se agrupavam em pequenos bandos de parentes consaguineos ou de pares em casal ou até mesmo sozinhos. As relações afetivo- sexuais desses seres tem início pelos símbolos sonoros desenvolvidos por um filam...

Castelo de Areia- Renê Paulauskas

 Ele chegava em casa, tirava a roupa e tomava um banho. Em seguida punha um pijama e chinelos. Sentava na poltrona da sala e ficava somente com as imagens dos objetos em volta, luzes e sombras e o barulho de sua respiração junto aos ruídos da vizinhança. Um pensamento ou outro passava pela sua cabeça, mas nada que o perturbasse. Nunca fizera yoga, nem curso de meditação. Achava ridículo alguém achar que, ficar olhando os objetos da sua sala sem muito o que pensar, fosse algo digno de elogios ou algo parecido.  Mas em outras horas era tragado por seus pensamentos onde sua aparência era de quem estava fora do ar. Ao mesmo tempo tinha uma mente limpa que era carregada por pensamentos complexos. Tinha muito tempo livre, e às vezes, não sabia o que fazer com o excesso de horas do dia. Pensava: "seria tão melhor se as pessoas trabalhassem menos e tivessem mais horas pra si". Para ele, inclusive.  Se sentia às vezes afastado do mundo. Como se tivesse numa redoma de vidro. Como s...

Carnaval do Capeta- Renê Paulauskas

 O evangélico abstêmio sai de casa para ir à igreja. O ônibus muda o trajeto por conta dos bloquinhos de carnaval. Desce e vai a pé. Uma loira de mini saia o para no caminho dizendo "Gostei!" Passando a língua nos lábios e sorrindo. Ele segue seu caminho pensando "Isso é coisa do demônio". Para pra comprar água de um ambulante que diz "Só tem cerveja!". Segue em frente naquele calor do cão, pensa "Faltam só quinhentos metros" quando vê a rua de acesso fechada. O bloco de carnaval o atropela. Passam a mão na sua bunda. Despejam bebida em sua boca. Seus olhos arregalam. Solta um riso demoníaco e pega um latão, beija na boca dos transeuntes. É levado pela multidão. Furtam-lhe a carteira e o celular. Passa mal no caminho. Vomita. Furta uma vodka, sai correndo bebendo no caminho. Fica aceso como um capeta. Dá uma risada demoníaca que ecoa no carnaval.

Materialidade das Coisas (conto) - Renê Paulauskas

Começou a perceber que as coisas tinham uma materialidade além de seus pensamentos. Uma formiga minúscula apareceu em sua mão. E em vez de olha-lá com calma e atenção, a matou. Em seguida reapareceu e a matou de novo. Já tinha visto deuses africanos, o espírito do seu pai, não poderia refutar tais visões jamais. Mas duvidava que hoje em dia as teria. Assim teve medo de renunciar tais visões. Mas acreditar no invisível ficou cada vez mais distante. E ficava contente que fosse assim. Enfim tinha um mundo em seus pés. Poderia desbrava-lo mesmo estando na meia idade. II A única mulher que às vezes desejava conhecera ainda criança, bem antes de se tornar mulher. Seu desejo era não por seus tributos pessoais, apesar de se tornar uma mulher muito bonita. Mas sim por ter sido durante longo tempo ela a deseja-lo. Sua primeira namorada também a conseguiu assim. Depois de saber de seu interesse a procurou e começaram a namorar. Já a moça, tinha tido uma filha e se casado. Parecia que não havia mu...

Acordado- Renê Paulauskas

 Lembro desde pequeno dos pregadores no varal e dos pregadores no chão, como se existisse um enigma a ser desvendado, se deveria ou não recolhe-los do chão e po-los no varal. Hoje penso menos nisso e minha resolução é por motivos mais práticos que abstratos. Me perdia horas em possíveis significados de sonhos. Fazia questão de lembrar das histórias como se fossem tão importantes como as acordadas. Mais novo ainda acreditava estar sonhando acordado. Duvidava da realidade como se tudo fosse um grande sonho impossível de se acordar. Hoje duvido muito dos meus sonhos, os interpreto como impulsos de descargas neurais enquanto o cérebro se reequilibra energeticamente. Acho que perdi um pouco meu lado mais da fantasia, mas me fez bem, eu era muito avoado.

Nosso Tempo - Renê Paulauskas

 Se pudéssemos nos afastar por um momento da nossa época para fazer uma análise de suas características, poderíamos dizer que nosso tempo é marcado por uma visão como se tivéssemos chegado no fim de todas suas possibilidades.  Como se tivéssemos chegado ao fim, da arte (como se todas possibilidades estivessem esgotadas), da vida (pelos eventos climáticos extremos), da sociedade (desinformação e fascismo). Assim o ser humano não vendo um futuro recorre a fuga, ora pela fantasia, ora desinformação (em formato de informação) deixando de lado o que seriam as coisas do mundo de fato gerando uma sociedade cada vez mais alienada e individualista dominada por quem controla o capital, a política e a informação. Numa zona cinza onde o capitalismo gera impacto ambiental e o mundo busca alternativas para não elevar ainda mais o clima extremo, a política se divide entre a consciência pela ciência e a barbárie pelo fascismo neo liberal. Como sairemos desse período negro, não sabemos. Talvez...

Saúde Mental - Renê Paulauskas

 Lá fora o mundo gira sobre forças materiais, leis da física, relações sociais, política, economia etc. No mundo interno o funcionamento das coisas tem haver com mundo mágico, afetos, crencas, superstições etc. É um mundo externo funcionando a todo vapor por pessoas movidas internamente por questões subjetivas às vezes só discutidas em análise. Saber equilibrar esses dois mundos é o sentido que carrego há anos, sabendo do perigo de um mundo engolir o outro, seja através do material, pelo excesso de trabalho. Ou pelo espiritual, gerando a loucura. Os dois efeitos colaterais se manifestam na falta de saúde mental. Que para estar equilibrada requer equilíbrio entre os dois mundos. Os remédios ajudam, análise faz parte, mas se o mundo interno não está funcionando bem de modo saudável, certamente não funcionará também na vida social. Do mesmo modo o excesso de trabalho pode deflagrar diversos transtornos mentais, que depois viram entraves para continuar a trabalhar. Pelo menos na mesma ...

Loucuras juvenis- Renê Paulauskas

 Nós pedíamos moedas para minha mãe para beber um litrão no bar mais barato do bairro. Éramos felizes com quase nada. Nos bastava os amigos, as amigas, como ela e a juventude.  Ela era sete anos mais velha do que eu, mas se sentia uma velha ao meu lado. Nos conhecemos por intermédio de uma outra amiga, maluca e ninfomaníaca, por quem eu estava interessado. Nos conhecemos no bar porão Lá Pe Jú perto da rua Augusta. Beijei ela na frente da ninfo pra fazer ciúmes. Perguntei "pra minha casa ou pra sua?". Ela falou que morava com o marido, mas estavam separados, foi aí que o caldo entornou. Meses depois estávamos os três: eu, ela e o marido como melhores amigos, comendo, bebendo, escrevendo, fazendo arte, os três. Mais tarde ainda descobri que ela falava pro marido que nós dois éramos somente bons amigos. E falava pra mim que estava separada quando não estavam. Ela estava apaixonada e eu só queria diversão. Um dia saímos eu, a ninfo, um amigo escritor e ela. Fomos num bar na Augus...

Vinil (conto) - Renê Paulauskas

 Vinil era um jovem inteligente que adorava contar suas histórias de ter prestado o Exército no fim dos anos noventa.  Seus amigos o adoravam e contavam que adolescente ele escalava o prédio em que morava na avenida Pompéia até seu apartamento no quinto andar. O conheci na escola de desenho por um amigo em comum. Conversamos rapidamente mas logo me convidou pra sair junto com sua amiga. Fomos numa Have no Bexiga. Passei meio mal e disse a ele que estava indo embora. Ele disse: __Vai com meu carro! __ Eu não sei dirigir. __ E rimos. II Vinil começou a me visitar em casa. Eu contava os sonhos que tinha tido com riqueza de detalhes. Ele falava das viagens que tinha tido com ácido. Até que depois de um tempo ele começou a falar umas coisas sem sentido. E começou a piorar. Eu não sabia bem o que estava passando com ele e preferi me afastar. III Longos anos se passaram até que o reencontrei, quando já estava terminando a faculdade. Trocamos telefones e marcamos de nos encontrar. Fiq...